
“Devemos reconstruir as nossas catedrais interiores”, explica o jovem que, ‘armado’ apenas com sua mochila, pôs em fuga um imigrante árabe assassino.
Marcelo Dufaur
No dia 8 de junho de 2023, Henri d’Anselme passava por uma praça em Annecy (Haute-Savoie, França), quando se deparou com um imigrante sírio de nome Abdelmasih H. apunhalando bebês e idosos [foto abaixo].
Ele então enfrentou o assassino usando como única arma sua mochila, e, arriscando a própria vida, colocou-o em fuga.

Depois contou, em entrevista ao jornal “La Croix”,* por que estava na praça. Quando criança, concebera o sonho de “fazer um grande tour pelas catedrais da França. Sempre fui fascinado pela catedral de Chartres, à qual peregrino todos os anos, e também pela catedral Notre-Dame de Paris”
Licenciado em filosofia e com mestrado em gestão, vendo o incêndio de Notre-Dame em 15 de abril de 2019 e a emoção geral que causou no mundo inteiro, Henri disse para si que “a ideia de criança talvez não fosse tão maluca”.
Quando em julho de 2022 um relatório do Senado reconheceu que o estado do patrimônio religioso na França era o mais ameaçado, Henri decidiu aos 24 anos realizar seu velho sonho. Trabalhou na reabilitação de um monumento histórico para ganhar algum dinheiro e comprar equipamentos para a caminhada que começou no dia 25 de março do ano passado, na festa da Anunciação.
Ele pensava que nos nove meses que decorreriam até o Natal — o tempo da gestação de Nossa Senhora — ele poderia ver as 175 catedrais, ou que no passado foram catedrais, e as co-catedrais da França.
Retorno das catedrais e reconstrução das catedrais interiores

Durante a romaria, Henri reforçou sua ideia de que as catedrais falam às pessoas e as tocam a fundo com sua beleza. Por outro lado, o dinamismo nacional e internacional pela restauração de Notre-Dame acentuou nele a vontade de salvar esta beleza ameaçada. Agora ele avalia que a catástrofe da catedral de Paris “talvez tenha marcado o retorno das catedrais”.
“A minha viagem significou a descoberta da beleza enquanto tal levado pela fé. Minha aventura foi, sobretudo, de conhecer pessoas e vê-las entusiasmar-se quando conto as minhas descobertas”, prosseguiu.
Ele passou a ter mais seguidores nas redes sociais. Nas ruas era reconhecido e cumprimentado. Antes lhe era difícil conseguir alojamento, depois tudo ficou mais fácil.
Numa hora em que o povo francês está muito dividido por temas de toda índole, ele está convencido de que “falar de beleza, mostrá-la e partilhá-la, cria unidade. Para mim, a unidade vem mediante a beleza. É a partir disso que podemos construir algo”.
E sublinhou: “Talvez o incêndio que atingiu Notre-Dame tenha sido ocasião para uma bênção. Talvez seja também um sinal de que devemos reconstruir as nossas catedrais interiores”.
“Esse problema afeta a Terra inteira. O que aconteceu vai além do edifício sagrado, toca a alma do nosso país e sua vocação”.
De onde provém a coragem do “herói da mochila”?

Henri concluiu que “num país descristianizado como o nosso, temos sinais de um retorno à espiritualidade e à fé, e penso que o impulso que se manifesta pela reconstrução de Notre-Dame é um deles”.
Interrogado sobre o que o motivou a agir tão corajosamente no perigo, ele explicou: “Acho que fui conduzido pela Providência. Eu não tinha consciência do perigo que representava para mim”.

E, quando inundado com telefonemas de jornalistas, percebeu que o simples fato de ele assumir a fé católica tocou as pessoas. “Eu queria dizer que todos são capazes de fazê-lo, desde que se alimentem com a beleza e a grandeza. Isso é o que nos traz de visita às catedrais, a levantar a cabeça para olhar os seus pináculos”.
“Se alimentarmos o amor da grandeza e da beleza, o mal não suportará. Não se deve acostumar a conviver com o mal. Ainda que assistamos anos de coisas horríveis, as catedrais proclamam a vitória de Cristo sobre a morte”.

Henri foi chamado de “o herói da mochila” e condecorado pelo presidente da França. Ele disse o que pensa: “Para mim, o heroísmo é uma disposição interior de abandono e determinação. O heroísmo é a busca em todas as ações de nossas vidas de um ideal que nos transcenda”.
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*https://www.la-croix.com/religion/-si-l-on-se-nourrit-de-beaute-le-mal-nous-devient-insupportable-20231207