Nos tempos longínquos em que goleiro ainda era goalkeeper, e goal não havia perdido aquela letra a desnecessária à nossa pronúncia, houve um momento em que desisti de tornar-me o maior goleiro do mundo. Veja bem, não posso afirmar com toda segurança que a minha carreira de craque (crack, naquela época, significava apenas um grande jogador) estivesse assim tão garantida. O fato bem comprovado é que a única posição adequada aos meus escassos entusiasmos futebolísticos era onde eu pudesse dedicar-me mais à observação, enquanto os outros faziam todo tipo de malabarismos para ultrapassar ou superar os adversários.
O momento decisivo para a minha desistência foi quando um adversário chutou para o gol onde eu exercia minhas funções. A bola não viu que eu estava por ali, e bateu bem no meu peito. Mesmo se eu não quisesse opor-me ao seu trajeto, ela não conseguiria passar. Agarrei-a valentemente e corri com ela para dentro do gol. Sob um coro de protestos, tomei conhecimento do meu gol contra, tendo corrido para o lado errado. Foi meu único gol na curta vida de atleta futebolístico. E fui injustamente excluído do time, por unanimidade, logo no instante em que as minhas altas cogitações transitavam bem próximo do campeonato mundial. Não adiantava deblatterar (nada a ver com dirigente da FIFA), e passei a exercer em cômodas arquibancadas minha outra função, a de observador, já que não me aceitavam como “rei do gol contra”.
Esse título frustrado me lembra uma crônica cujo autor (não me pergunte o nome) lamentava ter perdido a oportunidade de tornar-se o rei do futebol. E explicou que estava inscrito para um teste no Santos, mas um motivo qualquer o impediu de comparecer. Foi substituído por quem? Por um tal de Edson Arantes do Nascimento. Assim ele perdeu a vaga de “rei do futebol”, que por direito era dele.
A esta altura você já deve estar esperando que eu mude de assunto, pois sempre começo bem longe do que devo abordar. Então vamos ao que interessa: Basta oferecer a alguém uma oportunidade, para daí surgir um profissional brilhante? Pergunta muito importante, nesta época de múltiplas cotas para qualquer cor da pele que não seja a branca; de pistas preferenciais para veículos que não deviam transitar por ali; de empregos preferenciais para quem nunca comprovou sua aptidão; cargos de direção para quem não tem experiência teórica nem prática em direção; cotas para mulheres públicas onde deveriam estar homens públicos; cotas territoriais para quem nunca demonstrou competência nem apetência para cultivá-las ou administrá-las…
Nos Estados Unidos, país que tem sido o grande inspirador para tudo de bom ou ruim que o mundo inteiro vem copiando, a livre iniciativa, a meritocracia e o empreendedorismo sempre decidem na prática o que deve permanecer ou precisa ser abandonado. Fizeram lá uma experiência de cotas raciais nas escolas, imposta por governos esquerdistas, e depois foi simplesmente abandonada, devido aos altos custos e resultados pífios. Eles mesmos dizem que sempre escolhem o caminho certo, depois de tentar todas as alternativas. Quanto aos nossos atuais governantes, obstinam-se nas alternativas erradas, mesmo sabendo que são erradas.
Resta-nos então examinar o conjunto dessas nossas opções erradas, definir o que as caracteriza, em seguida elaborar soluções válidas. Eis um trabalho intelectual gigantesco. Confiado a estudiosos alemães sé-r-r-r-ios, ao fim de uma década teríamos volumosa enciclopédia destinada às estantes empoeiradas de outros estudiosos. Mas isso pode ser resolvido de modo rápido e fácil apelando para o bom senso, e assim chegamos ao meu campo de experiência comprovada. Respondo então em boa ordem, como fariam bons estudiosos alemães:
• 1ª pergunta — O que tem levado nosso País a tantas decisões prejudiciais?
Resposta — A mentalidade comunista, que sempre deu errado onde foi aplicada.
• 2ª pergunta — O que devemos fazer para consertar nossos erros?
Resposta — Abandonar radicalmente tudo que cheira a mentalidade comunista.
• 3ª pergunta — Quais as características principais da mentalidade comunista?
Resposta — O combate obstinado ao direito de propriedade e à livre iniciativa.
• 4ª pergunta — O que deve fazer o novo governo para adotar as medidas certas?
Resposta — Estimular a livre iniciativa e garantir o direito de propriedade.
Se os livros dos tais estudiosos alemães chegarem a conclusões diferentes destas, você pode alimentar com eles a fogueira das suas festas juninas. Embora minhas conclusões não pretendam esgotar nossos assuntos econômicos, convém pensar seriamente nesses pontos antes de decidir seus votos da próxima eleição. Boa oportunidade para participar na mudança dos nossos maus costumes políticos.
(O que tem a ver minha escolha de votos com futebol, cotas, etc?)
Releia a crônica com atenção, ligue todos os pontos, e lhe será fácil entender.
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(www.jacintoflecha.blog.br)
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