Não ocultemos as verdades

  • Padre David Francisquini *

Os católicos não devem ocultar como sob um véu os preceitos mais importantes do Evangelho, temerosos de serem talvez menos ouvidos, ou até completamente abandonados, advertiu São Pio X em sua encíclica “Jucunda Sane”. Afinal, a verdade e o bem não constituem mercadoria avariada que necessita entrar de contrabando, devendo, portanto, ser ensinados integralmente pela Santa Igreja.

Contudo, o mesmo santo pontífice explicou que “sem dúvida, não será alheio à prudência, também ao propor a verdade, usar certa contemporização, quando se tratar de esclarecer homens hostis às nossas instituições e inteiramente afastados de Deus”. Sobre as feridas que devem ser tratadas, São Pio X cita São Gregório Magno, segundo o qual elas devem ser apalpadas com mão delicada.

E conclui o raciocínio desse seu ensinamento de ‘nada esconder’ com as palavras que seguem: “Mas essa mesma habilidade assumiria o aspecto de prudência carnal se erigida em norma de conduta constante e comum; e tento mais que desse modo pareceria ter-se em pouca conta a graça divina, que não é concedida apenas ao sacerdócio e aos seus ministros, mas a todos os fiéis de Cristo.”

Uma das excelências da vida é meditar sobre os desígnios de Deus na criação. Temos para isso a filosofia e a teologia da História. Como bom pai, Deus sempre velou pelos seus filhos.  Quando Jesus Cristo se incarnou no seio puríssimo da Virgem Maria, Ele veio cumprir a Lei para a salvação do gênero humano, razão para O glorificarmos hic et nunc, isto é, agora e sempre, por todos os séculos dos séculos.

Assim, no Antigo Testamento, Deus suscitou patriarcas, profetas e doutores para instruir e guiar seus filhos já estabelecidos como povos. E no Novo Testamento — dando continuidade ao plano da salvação — suscitou apóstolos e discípulos para que, por sua vez, deixassem sucessores. Com efeito, esses homens de Deus disseram verdades… Detenhamos hoje num entre muitos desses apóstolos, São Luís Maria Grignion de Montfort (1673-1716).

Almas como a dele nos foram e nos são enviadas para atuar e fazer cumprir o plano de Deus num determinado período da História, atuando no plano específico da salvação para que os homens não se conformem com as máximas do século, conforme nos admoestou São Paulo, guiando os outros como os antigos profetas. Foi deste luminar francês que Deus quis se utilizar para estabelecer no mundo a forma completa e perfeita da devoção a Nossa Senhora.

Um homem para ser santo precisa praticar virtudes heroicas, e São Luís praticou, entre tantas outras, a de romper com a atmosfera otimista do contexto histórico no qual viveu; ele enfrentou com denodo a feroz intransigência dos despreocupados; suportou a não menos feroz perseguição do próprio episcopado, encerrando a sua vida missionária podendo pregar em apenas duas dioceses de seu país. Ou seja, a perseguição vinha de onde menos se esperava, mas ele tudo suportou. Por quê?

Em primeiro lugar, para a glória de Deus e, em segundo, porque sabia que assim agindo cumpria a missão que Deus lhe pedira, ou seja, pregar que “se de Maria veio Jesus Cristo, será também por Maria que Ele deve reinar na terra e nos corações. Este ensinamento veio preparar não apenas a vinda de outros homens com luzes proféticas para outras missões de guiar o Povo de Deus, mas explica a vinda da própria Mãe de Deus à Terra, tão grande a sua Misericórdia em relação aos seus filhos.

Apenas em outubro comemoramos duas dessas vindas, além de uma aparição milagrosa, a de Nossa Senhora Aparecida (1717). A primeira das vindas foi em Lepanto, no dia 7 de outubro de 1571, consagrado a Nossa Senhora do Rosário. A segunda foi bem mais recente, e com uma particularidade, Nossa Senhora falava português, ou seja, em Fátima (1917). Detenho-me nesta última, cuja última aparição ocorreu no dia 13 de outubro daquele ano.

Em suas mensagens em Portugal, veio confirmar o acerto e a necessidade dessa doutrina sobre Ela, pedindo com insistência que a difundisse pelo mundo inteiro, o que se deu 200 anos redondos depois da morte de São Luís Grignion de Montfort. Ela falou nomes de nações, inclusive que muitas delas iriam desaparecer; falou de guerras; falou de costumes e modas; por fim, que o seu Imaculado Coração triunfaria e teríamos a paz.

Com efeito, sua aparição ocorreu no dia 13 de maio, repetindo-se sempre no mesmo dia de cada mês até 13 de outubro daquele ano, com exceção do mês de agosto, quando os videntes estavam presos. Numa das aparições a Mãe de Deus mostrou aos videntes o inferno… Segundo narração da Irmã Lúcia, uma das videntes, “Nossa Senhora estende as mãos, emite um facho de luz que penetra a terra, por meio da qual as crianças puderam ver uma terrível cavidade, e nelas se via um pavoroso mar de fogo, com almas incendiadas pelo fogo que delas mesmas saía, viam-se, também, demônios, como negros carvões em chamas, neste mesmo oceano de fogo.”

Ela, portanto, Mãe nossa, nada velou às crianças, por mais aterrorizante que pudesse ter sido tal visão. Pediu a comunhão reparadora dos cinco primeiros sábados, a recitação do terço, a mudança de vida e a “consagração da Rússia” ao Seu Imaculado Coração.  Caso fossem acatados os pedidos d’Ela, haveria paz no mundo; caso contrário, a Rússia espalharia seus erros pelo mundo.

A última aparição de Nossa Senhora na Cova da Iria deu-se um mês exato antes da revolução comunista na Rússia. E como os seus pedidos não foram atendidos, ou o foram molemente, a partir dessa revolução aconteceu o que Ela predisse, ou seja, os erros comunistas grassaram e ainda continuam grassando pela Terra. Não existe um só rincão no orbe que não esteja maculado por algum de seus erros.

E Nossa Senhora continua nos avisando não apenas no íntimo de nossos corações, mas também nos acontecimentos de hoje, como com a pandemia da Covid e suas consequências; nos fatos políticos e até nos fenômenos da natureza… São parábolas? Bem que poderão ser. Lembremo-nos do ensinamento de Nosso Senhor na pena de São Mateus, 13: “Por que razão lhes falas por meio de parábolas? E ele, respondendo, disse-lhes: Porque a vós é concedido conhecer os mistérios do reino dos céus, mas a eles não. Por isso lhes falo em parábolas, porque vendo não veem, e ouvindo não ouvem, nem entendem.”

O mês de outubro é consagrado a Nossa Senhora do Rosário, cuja festa se celebrou no dia 7. Mas temos ainda Nossa Senhora Aparecidano dia 12 e no dia 13 Nossa Senhora de Fátima. Ocasião propícia para meditarmos que no tempo em que o Filho de Deus se fez carne em Nossa Senhora, o mundo não era mais digno de receber Nosso Senhor Jesus Cristo. Portanto, se o Padre Eterno O enviou não foi por causa do mundo, mas por causa de Nossa Senhora, foi para atender a um pedido d’Ela, tal é o poder de sua súplica.

Lembremos mais uma vez que somos seus filhos e supliquemos a Ela que nos ajude com seu maternal auxílio.

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*Sacerdote da Igreja do Imaculado Coração de Maria – Cardoso Moreira (RJ).