Oito fatos sobre a Rússia e sua guerra contra a Ucrânia

  • John Horvat II

Independentemente de como se considere a Guerra na Ucrânia, certos fatos contradizem a atual narrativa da mídia de uma luta entre o globalismo liberal e um regime teocrático. Vários desses fatos se tornaram especialmente evidentes no discurso de Putin à Assembleia da Federação, a respeito da guerra em seu primeiro aniversário e o futuro da nação. Outros fatos podem ser obtidos a partir das notícias.

Tais fatos são:

  1. O projeto de Putin segue a “quarta teoria política” de Alexander Dugin, seu ideólogo, contra o globalismo. Dentro dessa teoria, os diferentes povos criam civilizações, formando grandes espaços e blocos civilizatórios. Dugin acredita que os estados-nação menores desfrutam da aparência de soberania sob a égide de “centros civilizacionais politicamente organizados e militarmente capazes que representam os polos de um mundo multipolar”. [Tradução: A Ucrânia não tem o direito de ser uma nação livre, independente e soberana.]
  2. A guerra na Ucrânia procura forçar a relutante nação ucraniana a se colocar sob este guarda-chuva. O conflito desencadeou rupturas políticas e econômicas irrevogáveis com o mundo globalizado que facilitam a formação de um mundo multipolar.
  3. Tanto a Rússia quanto o Ocidente são frutos da modernidade. Os dois sistemas compartilham raízes filosóficas que remontam à Revolução Francesa. O Ocidente adotou o modelo liberal suave, hoje em processo de decadência. A Rússia agora segue o modelo nacionalista nietzschiano linha-dura, fortemente influenciado por pensadores alemães como Martin Heidegger. Ambos os lados também são influenciados pelos efeitos nocivos dos pensadores existencialistas e pós-modernos.
  4. Até 2022, a Rússia fazia parte de todo o coração da sociedade globalista que agora ela afirma odiar. Sua economia foi totalmente integrada à rede global. Seus produtos, especialmente o petróleo, o gás natural e os grãos, eram vendidos nos mercados mundiais de commodities delineados em dólares. Antes da mudança abrupta dos acontecimentos, suas cidades recebiam as multinacionais do varejo espalhadas por todo o seu vasto território. As sucessivas ondas de sanções testemunham a enorme extensão dessa integração e a dificuldade de se desemaranhar dela.
  5. A Rússia, infelizmente, compartilha da decadência moral do mundo moderno. O estado de sua decadência é comparável ao dos países ocidentais. A nação sofre com a maior taxa de aborto do mundo, baixas taxas de natalidade, baixa prática religiosa e declínio nos casamentos. Ao contrário dos relatos da mídia, Putin não tem objeções à presença LGBT na Rússia (exceto para crianças). Em seu discurso de 21 de fevereiro, ele fez questão de dizer: “Os adultos podem fazer o que quiserem. Nós, na Rússia, sempre vimos dessa forma e sempre veremos: ninguém vai se intrometer na vida privada de outras pessoas, e nós também não vamos fazer isso”.
  6. Ambos os sistemas depositam muita fé no poder do Estado. Os estabelecimentos políticos ocidentais de há muito promovem programas, regulamentos e redes massivos. O discurso de Putin delineou principalmente uma montanha de programas e iniciativas governamentais de trilhões de rublos para atender às necessidades dos cidadãos em uma sociedade dirigida pelo Estado.
  7. Fiéis às suas origens modernas, ambos os sistemas são seculares em sua expressão. O liberalismo, por sua natureza, sempre afirmou —falsamente — ser neutro em questões de religião. No entanto, o discurso principal de quase 40 páginas de Putin surpreendentemente não menciona o Deus cristão, nem trata de temas religiosos que poderiam ser esperados nestes tempos de provação.
A Rússia compartilha da decadência moral do mundo moderno. O estado de sua decadência é comparável ao dos países ocidentais

Os sete fatos ilustram que o retrato da mídia é falho. A verdadeira luta não é entre um mundo globalizado ultraliberal decadente e um Oriente teocrático e autocrático. Ela envolve um mundo inteiro moralmente podre, filosoficamente falho, financeiramente comprometido e politicamente desordenado. Ambos os sistemas representam dois lados da mesma moeda corrompida da modernidade.

De um lado estão os que defendem a ordem do pós-guerra com todos os seus erros. Do outro lado está o eixo Rússia-China-Irã, que quer quebrar essa ordem e estabelecer seu enigmático mundo antiocidental multipolar.

A Ucrânia é o palco relutante para o drama que visa destruir a ordem do pós-guerra e desencadear a próxima e pior fase de um processo revolucionário determinado a demolir o que resta do Ocidente cristão. Porém, a invasão da Ucrânia não saiu conforme o planejado. A inesperada defesa ucraniana de sua soberania perturbou a narrativa.

A solução para a infeliz situação do mundo só poderá ser sobrenatural. Já em 1917 Nossa Senhora o afirmava em Fátima.

Isso dá origem a um oitavo fato, que deve ser considerado para avaliar as duas causas.

  • A humanidade não deu ouvidos à Mensagem de Fátima. Em 1917, em Fátima, Portugal, Nossa Senhora alertou o mundo sobre a necessidade de oração, especificamente a recitação do Rosário, a penitência e a emenda de vida, para escapar do castigo divino. Se a Rússia lhe fosse consagrada, Nossa Senhora prometeu que se converteria à Fé.

Assim, aqueles que procuram soluções políticas dentro dos dois quadros seculares, ficarão desapontados. A reforma fundamental necessária é moral. A solução final será sobrenatural. No entanto, as pessoas se recusam a considerar o sobrenatural ou moral.

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* O articulista é colaborador de Catolicismo, vice-presidente da TFP norte-americana e autor do best-seller Return to Order.