
- Pe. David Francisquini
Não sem apreensão, li a nota da Congregação da Doutrina da Fé emitida pelo Cardeal Victor Manoel Fernandes a respeito da devoção a Nossa Senhora, pois tudo o que se refere à Filha dileta de Deus Pai, à Mãe amável de Deus Filho e à Esposa fidelíssima do Espírito Santo toca numa sublimidade quase indizível, por ser Ela a obra-prima da Criação. Com efeito, a Virgem é o primeiro e principal membro da Igreja, e ao mesmo tempo está acima dela, intra Christum et Ecclesiam, como ensinou São Bernardo.
Não foi a Congregação da Doutrina da Fé impelida por nenhuma questão premente no orbe católico para tratar de assunto tão assente na doutrina da Igreja, como Nossa Senhora Medianeira de todas as Graças, bem como Corredentora do gênero humano junto de seu divino Filho. Portanto, causa estranheza a publicação da recente Nota doutrinal sobre alguns títulos marianos referidos à cooperação de Maria na obra da Salvação, ao julgar “sempre inoportuno” o título de Corredentora e “arriscado” o de Medianeira de todas as graças, para Nossa Senhora.
Parece estar mais preocupado em criticar e afastar os fiéis da devoção a Nossa Senhora do que promovê-la. Sinto-me ser eu compelido a expressar o que penso e aprendi sobre a Mãe de Deus. Ter devoção a Nossa Senhora não deixa de lado a Pessoa Adorável de Jesus Cristo, pelo contrário. Documentos tanto do Antigo quanto do Novo Testamento, como os santos padres e doutores defendem, atestam que Ela é única diante do plano da salvação.
O próprio Deus pôs seus olhares de benevolência nesta criatura privilegiada que é o elo ou aliança entre o Criador e as criaturas, entre Deus e os homens. Ela sempre foi reconhecida pelos fiéis ao longo da História. Sob quantos títulos Ela é lembrada, honrada e dignificada na Ladainha Lauretana, ora como Virgem das virgens, Mãe da divina graça, ou ainda como Rainha dos anjos, dos patriarcas, dos profetas, de todos os santos…
Creio ser de São Luís Grignion de Montfort a expressão de Maria nunquam satis (nunca é demasiado) falar. Este mesmo santo afirma que se Deus quis se servir d’Ela para vir ao mundo, é por meio d’Ela que Ele deseja salvá-lo. Negar isso é negar a evidência, pois não se pode separar da chama a luz e o calor, a aurora do sol nascente. Jesus é todo de Maria e Maria é toda de Jesus. Jesus utilizou de Maria para vir a nós e A estabeleceu para levar a Ele.
A conexão entre mãe e filho é uma determinação do próprio Criador que desejou que assim fosse. Maria esteve sempre presente na vida de Jesus. Se Jesus é o único Salvador e Mediador, não foi sem Maria, que quis começar a sua missão aqui na Terra, ao realizar seu primeiro milagre nas bodas de Caná. Essa conexão íntima entre Jesus e Maria não pode ser negada, sob pena de aderir às seitas protestantes. Santo Afonso de Ligório lutou contra as ideias jansenistas que minimizavam a devoção a Ela, a tal ponto que desenvolveu uma devoção séria e com princípios a Maria Santíssima.
Constatamos esta verdade no seu livro Glórias de Maria Santíssima. Nossa Senhora quis estar aos pés da Cruz por dever de sua missão de Mãe a fim de oferecer o sacrifício juntamente com seu Divino Filho, para a redenção do gênero humano, e assim gerar novos filhos. Portanto, mereceu ser Medianeira e Corredentora do gênero humano. Papel único e inconfundível, estando intimamente ligada ao seu Filho para a salvação do mundo. Se da primeira mulher, Eva, veio a morte, da segunda Eva, veio a vida, a salvação. Se de Eva veio a desobediência para a humanidade toda, da nova Eva veio a cheia de graça, Maria.
Deus quis se servir de Maria para que d’Ela viesse o Salvador do mundo, e a honrou com todas as graças e perfeições para que assim o Filho de Deus se fizesse homem, habitasse entre nós e nos redimisse. Não desagrademos ao Filho criando embaraços para a Mãe, pois se quisermos agradar ao Filho tratemos da melhor maneira possível a sua Mãe. Assim seja, por todos os séculos dos séculos.