
De nobre família, foi eleito bispo aos 25 anos; discípulo de São Pedro Damião, que escreveu sobre sua frutuosa vida.
- Plinio Maria Solimeo
Rodolfo nasceu em 1034 no castelo de Monte Cavallo, em Camporeggiano, perto de Gubbio, filho de Rodolfo e Rezia Gabrielli, senhores feudais locais. Sua família pertencia à nobreza local e tinha muita influência na Corte.
Nessa época brilhava na Igreja e na Itália, por sua sabedoria e santidade, São Pedro Damião, futuro Doutor da Igreja, prior do mosteiro camaldulense de Fonte Avelana, aos pés dos Apeninos, cuja vida tratamos nesta revista na edição de fevereiro último.
Em 1051, quando Rodolfo tinha 17 anos, São Pedro Damião visitou Monte Cavallo. Impressionado pela sua personalidade, e sobretudo pela sua santidade, o jovem decidiu fazer-se seu discípulo.
Quando seu pai faleceu, ele e seu irmão Pedro, que será beatificado, transferiram parte da herança à sua mãe e ao irmão caçula, João. Mas este sugeriu que doassem o castelo ancestral e parte dos demais bens da família a São Pedro Damião, para que deles dispusesse, e ingressassem no mosteiro de Fonte Avelana.
O espírito religioso na Idade Média era muito profundo e levadofrequentementeaté às últimas consequências. Assim, algum tempo depois, tanto a mãe de Rodolfo quanto seu irmão João tudo abandonaram, doaram o resto de sua fortuna à Igreja e se fizeram religiosos.

O mosteiro de Fonte Avelana
Segundo a tradição, no mosteiro de Fonte Avelana, dedicado à Santa Cruz, viveram 76 monges, entre santos e beatos. Em 1043, São Pedro Damião tornou-se seu prior. Ele não apenas ampliou o edifício original, mas fez do eremitério um ponto de referência religioso e social.
Um parêntese. Como acontece com tudo neste vale de lágrimas, com o passar dos anos, ou melhor, dos séculos, tendo os camaldulenses deixado esse mosteiro, ele entrou em decadência. Entretanto, depois da invasão de Napoleão e a partir de 1810, conheceu um novo afervoramento. Retornando à gestão dos camaldulenses em 1935, Fonte Avelana recuperou muito do seu antigo esplendor espiritual e arquitetônico. Atualmente seu prior é um brasileiro, dom Cristiano de Oliveira Souza, natural de Guaratinguetá.
Não temos dados de como é a vida nesse mosteiro nos correntes dias, mas no tempo de São Rodolfo era muito rigorosa. Segundo a regra, seus eremitas jejuavam ordinariamente quatro dias por semana a pão e água. E nos outros dias juntavam a isso apenas um pouco de legumes cozidos. Por penitência, andavam sempre descalços, tinham prolongada oração e se flagelavam em alguns dias da semana.
Assim,a vidalá era simples, voltada apenas ao trabalho, à caridade aos pobres e doentes, e dedicada à penitência e à oração contemplativa.
No período medieval, o mosteiro foi um verdadeiro oásis que surgiu para a revitalização da vida monástica, uma vez que a Igreja ocidental vivia grande desgaste com conflitos internos causados pela ambição e ganância de bispos e sacerdotes, mais interessados nos bens mundanos do que na condução do rebanho do Senhor.
Com parte dos bens recebidos, principalmente da família Gabrielli, São Pedro Damião decidiu construir no vale de Camporeggiano a abadia de São Bartolomeu, designando o monge João Gabrielli, irmão de Rodolfo, para seu primeiro abade.
Em 25 de janeiro de 1063, por sugestão de Rodolfo, o mosteiro de Camporeggiano e a abadia de São Bartolomeu, que se tornara grandiosa e rica em possessões em vários distritos da Úmbria, foram retirados pelo Papa Alexandre II da jurisdição do bispo de Gubbio e submetidos diretamente à Santa Sé.
Ordenação sacerdotal
Aos 25 anos de idade, Rodolfo recebeu a ordenação sacerdotal. Como verdadeiro ministro de Deus, passou a levar uma vida ainda mais austera, feita de oração e penitência. Tomava disciplina para enfraquecer a exuberância juvenil, usava vestes de saco, decidiu abster-se decarne, ovos e queijo, e a dormir numa mesa de madeira sem cobertores.
São Pedro Damião tinha em tão elevada conta o jovem sacerdote, que lhe pediu em cartaque “revisasse os seus escritos, e corrigisse tudo o que neles encontrasse que diferisse da doutrina católica e da correta interpretação da Sagrada Escritura”.
Mas o santo Doutor da Igreja fez mais: em 1058, embora Rodolfo ainda não tivesse atingido a idade canônica, o propôs ao Papa Nicolau II para substituí-lo como bispo de Gubbio, pois pedira afastamento dessa diocese.
Desse modo, por ocasião do Concílio Romano realizado na Cidade Eterna em abril do ano seguinte (1059), o Papa confirmou aquela nomeação. Por obediência, Rodolfo teve que aceitar a liderança da diocese de Gubbio, com “paciente repulsa” pela vida mundana que a posição implicava. Ele tinha, como dissemos, apenas 25 anos.
O “Livro de Gomorra”

A época em que esses santos viveram foi de grandes tribulações na Santa Igreja de Deus. Basta dizer que durante os 65 anos da vida de São Pedro Damião [imagem ao lado] nada menos que 16 Papas a governaram. Além disso, por abuso de poder, os príncipes distribuíam abadias e bispados entre seus favoritos carentes de ciência e virtude, havendo por isso inúmeros sacerdotes indignos, ignorantes e luxuriosos, que compravam o episcopado.
Sobre isso São Pedro Damião escreveu o Livro de Gomorra, que dedicou ao Papa São Leão IX, no qual fustigava com vigor os desmandos da época, sobretudo dos eclesiásticos. Pois, “era coisa inteiramente pública e de uso comum comprar-se benefícios
[eclesiásticos]
a preço de prata. Não se tinha mais consideração pela capacidade nem pelos bons costumes, que são, entretanto, as únicas qualidades de que se deve ter em conta, segundo os santos cânones, na distribuição dos benefícios. Comprava-se mesmo a ordenação sacerdotal. A outra desordem era a de que esses padres, calcando aos pés a santidade de seu estado e as leis eclesiásticas, ousavam contrair matrimônio, e com tanta pompa e brilho quanto os seculares”[i].

Pureza e austeridade na vida eremítica
São Rodolfo foi o primeiro dos três bispos santos de Gubbio em um século, seguido de São João de Lodi e Santo Ubaldo.
Gubbio era uma diocese muito problemática para a Igreja. Os bispos anteriores haviam instituído o que se chamou “ressarcimento”, isto é, os sacramentos eram condicionados a pagamentos e não aos méritos ou à vocação religiosa. Alguns sacerdotes chegavamao cúmulo de pedir dinheiro para a absolvição dos pecados e bispos pediam comissões para ordenar sacerdotes.
São Rodolfo enfrentou a situação com espírito sobrenatural e destemor, não renunciando à pureza da vocação monástica e às austeridades da vida eremítica. Vestia-se sempre com roupas velhas e surradas, fosse qual fosse o tempo ou a estação. Comia pouco, e só as sobras de pão dos servos com água, impondo-se severo jejum. Dormia muito pouco, mantendo-se em vigília constante na oração e penitência. Não usava calçado e, apenas no inverno, tamancos de madeira.
Percorria infatigavelmente toda a sua diocese, estando sempre pronto para atender os pobres, doentes e abandonados. Tornou-se o exemplo da humildade e da caridade cristã, um verdadeiro sacerdote da Igreja. Assim, com seu apostolado de presença marcado pela santidade de vida, ele conseguiu recolocar Gubbio no verdadeiro caminho do amor a Cristo e à Virgem Santíssima.
O santo reunia anualmente o Sínodo Diocesano, mas proibia que seus padres lhe trouxessem presentes e pagassem impostos. Dom Rodolfo era um pregador excelente e convincente, erudito e zeloso. Educou o clero e o povo, visitou igrejas e paróquias, mas sobretudo esteve sempre em contato com os pobres e humildes.
Vítima de sua penitência

Infelizmente, por secretos desígnios da Providência Divina, seu episcopado foi apenas de cinco anos, durante os quais participou de um concílio romano em 1059.
Contudo, os longos e severos jejuns do bispo acabaram debilitando-o e ele adoeceu gravemente. Foi curado, talvez pela mãe Rezia, e se recuperou. Mas logo retomou a prática da penitência com novo ardor. Uma recaída o levou à morte por tuberculose, a 17 de outubro de 1064.
Seu mestre, São Pedro Damião, escreveu que ele passou “desta luz enganadora ao Autor da luz eterna”.
Quando morreu, Rodolfo tinha apenas 30 anos de idade. Entretanto, sua obra não chegou a ser interrompida, pois foi substituído por seu irmão João, que seguiu o seu exemplo de bispo benevolente com o rebanho, mas rigoroso consigo mesmo.
Rodolfo foi sepultado na catedral de Gubbio. Seus diocesanos imediatamente o aclamaram como santo, pela sua caridade exemplar e pelo seu desapego do mundo. Seu culto foi posteriormente confirmado por numerosos papas. Rodolfo é hoje considerado o primeiro de uma série de três grandes santos bispos que reformaram a igreja de Gubbio entre os séculos XI e XII, sendo os outros São João de Lodi e Santo Ubaldo.
Em 26 de junho de 1188 seu corpo foi transferido para o novo edifício da catedral, onde lhe foi consagrado um altar, que infelizmente desapareceu na sequência das obras de renovação do edifício realizadas em 1670.
Os detalhes da vida de São Rodolfo são conhecidos principalmente através da biografia escrita por São Pedro Damião, a Vita Sancti Rodulphi Episcopi Eugubini. Esta obra, em forma epistolar, tem a sua origem na carta que o mesmo santo escreveu ao Papa Alexandre II — quem lhe ordenara que lhe enviasse apenas cartas edificantes, que mereciam ser preservadas — para anunciar a morte do jovem bispo
Nessa carta, São Pedro Damião louva a vida de Rodolfo, notadamente seu espírito de oração e penitência, e sublinha sua cultura teológica e seus conhecimentos bíblicos. Diz que ele era maravilhosamente desinteressado e que seu episcopado se caracterizou por sua caridade exemplar. Diz também que Rodolfo foi o modelo de bispo eremita que aplica os princípios da vida ascética à liderança da diocese, segundo a fórmula quod in eremo didicit, in ecclesia non omisit (que aquilo que aprendeu na ermida não o esqueceu na igreja) e por isso é apresentado como um pequeno compêndio dedicado à correta administração das dioceses.
A
festa de São Rodolfo era celebrada a 17 de outubro, dia de sua morte, mas foi
transferida para o dia 26 de junho.
[i] Les Petits Bollandistes, Vies des Saints, Bloud et Barral, Libraires-Éditeurs, Paris, 1882, tomo II, p. 634.
Outras obras consultadas:
– San Rodolfo Vescovo in https://www.santiebeati.it/dettaglio/74250
– https://es.catholic.net/op/articulos/37382/rodolfo-santo.html
– http://alexandrina.balasar.free.fr/rodolfo_de_gubbio.htm