Por que os Estados Unidos devem rejeitar o isolacionismo?

“Iwo Jima Memorial”, no condado de Arlington, Virgínia

Manifesto publicado pela

Sociedade Americana de Defesa

da Tradição, Família e Propriedade

em 22 de agosto de 2024

Com o desmoronamento da ordem liberal, muitas pessoas estão propondo alternativas que exigem grandes mudanças nas imperfeitas estruturas globalizadas que moldam o mundo. Alguns setores do público estão se voltando para movimentos nacionalistas e populistas que se fecham em si mesmos, reivindicando que a nação renuncie seus compromissos mundiais para se concentrar tão-só nos problemas domésticos. No perigoso cenário mundial de hoje, tais soluções ignoram o quadro mais amplo que é indispensável ter em mente.

Diante desta situação, a Sociedade Americana de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP) apresenta abaixo algumas reflexões sobre o isolacionismo e seus perigos. Limitamo-nos à questão do isolacionismo, sem discutir outros temas importantes. Como católicos leigos, recorremos ao rico tesouro dos ensinamentos sociais da Igreja para contribuir com este urgente debate.

Introdução

Há os que afirmam que os Estados Unidos devem renunciar ao seu papel de liderança no mundo. Acabou-se o tempo de projetar poder, se é que já houve um. Entra em cena uma nova onda populista e nacionalista, exigindo que os Estados Unidos abandonem o mundo a favor de um sistema de estados-nação independentes e não intervencionistas.

De fato, argumentam, o mundo não precisa mais de nações fortes que protejam as mais fracas, exerçam uma boa influência e ajudem a defender o comércio internacional, a fé e a cultura cristãs, ou o estado de direito. Em vez disso, cada país deve buscar implacavelmente seu próprio interesse, substituindo o globalismo desenfreado por uma política de soberania nacionalista. Os problemas do mundo começam quando surgem nações fortes que sucumbem a tentações imperialistas.

Essa perspectiva nacionalista afirma ainda que a Guerra Fria já acabou há muito tempo e que sua política de poder não se aplica mais. Em seu lugar, há um cenário mundial multipolar pós-moderno em que as nações interagem e traçam seus rumos de maneira independente.

Os Estados Unidos podem continuar a ser uma nação influente e próspera. Porém, o fator determinante das relações internacionais deve se basear em políticas que beneficiem diretamente os cidadãos de cada país.

Se algumas nações precisam de proteção ou ajuda, elas devem pagar para tê-las. Se outras preferirem não interagir, que se deixem afundar em um confortável isolacionismo — convite feito também aos Estados Unidos.

A História refuta o isolacionismo

A História desmente essa visão. Onde quer que as sociedades humanas se formem, sempre surgem relacionamentos e dificuldades entre comunidades vizinhas. Harmonizar tais relacionamentos requer confiança mútua, cooperação e esforço, podendo exigir que alguns sacrifiquem interesses próprios em prol de um bem maior.

Além disso, eventos dramáticos, como o ataque a Pearl Harbor em 1941, podem colocar rapidamente fim à opção isolacionista. O mundo real está repleto de adversários motivados por ambição, ganância ou maldade ideológica, dispostos a explodir a paz para promover suas agendas. Assim, quando ameaçadas por ataques injustos, as nações mais fracas devem buscar alianças de defesa potentes nas quais países mais fortes as ajudem ainda que isso não sirva seus interesses imediatos.

Tais situações exigem a união de esforços de uma comunidade de nações que possa enfrentar ameaças e agir em conjunto para salvaguardar a paz internacional. Esses acordos e alianças de defesa mútua devem se basear em princípios morais que obedeçam a uma lei superior e transcendam o interesse próprio para que não se transformem em esquemas de poder brutais e prejudiciais ao bem-estar geral das nações.

Assim, soluções reais devem se basear em uma compreensão adequada da natureza humana, de sua dimensão social, e de como essa natureza compartilhada une os povos. Tais soluções requerem também uma noção correta dos princípios de justiça e caridade que moldam o funcionamento de uma comunidade de nações e de que maneira um ou mais países podem intervir em outros.1

O Magistério tradicional da Igreja Católica e os ensinamentos de seus teólogos e filósofos oferecem noções claras e cogentes da ordem social e da lei natural e de como ver e avaliar esses problemas adequadamente. Eles fornecem uma orientação objetiva, verdadeira e muito necessária sobre como navegar nestes tempos incertos.

O isolacionismo visto sob duas perspectivas

Uma discussão objetiva sobre o isolacionismo e seus perigos deve dirimir a tensão artificialmente provocada entre idealismo e realismo nas relações exteriores. Ela envolve duas perspectivas.

A primeira perspectiva é uma discussão teórica sobre um idealismo saudável que defina os princípios que devem reger um relacionamento adequado entre as nações. Ela deve explicar o papel ideal das potências dominantes e a obrigação moral universal das nações de se ajudarem mutuamente em momentos de aflição.

A segunda perspectiva discutiria como aplicar esse ideal na política externa do mundo real. Ela explicaria quando e como as nações devem intervir com prudência nos assuntos mundiais a fim de manter a paz.

Essa perspectiva prática, que diz respeito especialmente aos Estados Unidos, deve definir também as condições para se exercerem, com relação a outras nações, políticas baseadas em regras comuns, evitando tentações de conveniência política.

Assim, uma perspectiva católica alcança um equilíbrio sábio entre ideais corretos e exigências prudentes do realismo na política externa, propondo um caminho a percorrer.

Dada a situação caótica em que se encontra o mundo, é preciso tratar estas questões com certa urgência.

O ataque a Pearl Harbor, em 1941, pôs fim à opção isolacionista dos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial

A – Ideais adequados de política externa e a tentação isolacionista

     1. Isolacionismo individual

Para entender melhor como o isolacionismo afeta as nações, convém analisar antes seu efeito sobre os indivíduos.

As pessoas podem ser tentadas pelo isolacionismo, que consiste em renunciar a seus instintos sociais para resolver seus problemas confiando apenas em si mesmas. Ser social requer depender de outros, o que exige humildade e esforços para resolver desentendimentos e complicações que as almas egoístas preferem evitar.

O pesado fardo da natureza humana decaída leva as pessoas à ganância e à autoindulgência, o que muitas vezes as faz ignorar os legítimos interesses alheios. O isolacionista rejeita as interações sociais em favor de contratos frios e distantes.

Entretanto, esse isolamento não deixa de ter consequências. Ele prejudica tanto os indivíduos quanto a sociedade. De fato, a Igreja ensina que os indivíduos geralmente não conseguem se aperfeiçoar isoladamente. Como seres sociais contingentes, dependem da sociedade, e especialmente da família, da comunidade local, das associações intermediárias, do Estado e da Igreja para superar suas deficiências.

As pessoas precisam umas das outras para dar e receber a ajuda de que necessitam para alcançar a perfeição de sua natureza essencialmente social.2

A necessidade de uma comunidade é tão importante, que o filósofo social e político católico Heinrich A. Rommen escreve enfaticamente: “Em última análise, para um indivíduo, qualquer tipo de isolamento da plenitude da vida comunitária acarreta uma perda pessoal, uma automutilação, uma atrofia, um defeito em sua autorrealização.3

Portanto, qualquer movimento de isolamento é contrário ao progresso e à perfeição do indivíduo,4 prejudicando também a sociedade. O isolamento de um indivíduo priva os outros de suas qualidades. Isso tem um impacto negativo sobre o bem comum porque a sociedade precisa da contribuição de todos, com a qual se beneficia.

     2. As nações também dependem umas das outras

A aversão de um indivíduo isolado à dependência e à interação social pode ser transposta para a política isolacionista de algumas nações. Quando fechadas em si mesmas, tais nações passam a sofrer de uma autarquia sufocante e não conseguem desenvolver todo o seu potencial.

Assim como os indivíduos atingem sua plenitude por estarem em comunidade com outros, também as nações precisam umas das outras. A partir dessa necessidade, forma-se naturalmente uma comunidade de nações.5

Isso é especialmente verdadeiro para as nações cristãs, que em sua interação formam uma verdadeira irmandade em Cristo, motivada pela caridade e pela graça. Viu-se esse vínculo durante séculos na noção de Cristandade.6

     3. O direito ao comércio entre as nações

Um exemplo da necessidade de uma comunidade de nações é o comércio internacional. A doutrina da lei natural defende a necessidade do comércio porque a insuficiência dos recursos das nações as obriga a buscar a ajuda de outras por meio do intercâmbio de bens e serviços.7

Deus deu a Terra à humanidade como um todo e, portanto, todos desfrutam de certos direitos à Terra em virtude de sua natureza humana comum. Entretanto, esses bens são distribuídos de forma desigual entre as nações. Alguns países sempre terão bens e recursos de que outros precisam, e daí surge o direito ao comércio internacional.

Assim, todas as nações têm direito a algum grau de acesso à riqueza da Terra, o que é facilitado pelo comércio internacional. Um isolacionista radical nega esse direito universal e impede que outros o exerçam, prejudicando todas as nações envolvidas.

Esse direito ao comércio facilita conexões que vão além do fornecimento de bens materiais. As interações espirituais e culturais também desempenham um papel no desenvolvimento das nações.

Esses vínculos ajudam as pessoas a ampliarem seus horizontes, culturas, talentos artísticos, conhecimentos científicos e tecnologias. O papel das nações líderes é especialmente eficaz nesse sentido. Acima de tudo, esse intercâmbio pode proporcionar condições para que o Evangelho se torne conhecido e aceito em todo o mundo.

Outro aspecto desse direito ao comércio é que ele naturalmente leva ao estabelecimento de regras e mecanismos estáveis para facilitar o comércio e a força militar necessária para protegê-lo.8

     4. Condições para o florescimento do comércio internacional

Esse comércio entre nações deve ser amplo e comum. Entretanto, também deve ter limites razoáveis. Ele deve respeitar as normas, a propriedade privada e a soberania nacional. O comércio internacional não deve dominar ou destruir a cultura e a economia locais. Ele não deve impedir a produção nacional de bens estrategicamente importantes. Assim como as nações devem respeitar os direitos de outras nações, elas têm também o direito de se defender contra práticas comerciais injustas.

Se as condições adequadas forem observadas, o comércio internacional beneficiará a todos. Ele dá origem a instituições internacionais de “proteção” que podem ajudar a comunidade das nações a negociar de forma justa e com respeito mútuo. Ele prepara a base para o estabelecimento de padrões comuns para a entrega de correspondências, proteções de direitos autorais, acordos de reclamações, contratos, e vários outros meios para ajudar as relações internacionais e o comércio a florescer.

Por outro lado, o isolacionismo rígido coloca em risco o desenvolvimento normal de cada país e prejudica o bem comum da comunidade de nações. Ele impede que elas recebam ajuda externa em tempos de crise e priva seus cidadãos de bens e serviços de que precisam para seu legítimo desenvolvimento.

     5. Intervenções no exterior para além do comércio

Muitos isolacionistas aceitam a necessidade do comércio internacional e as regras e instituições que o acompanham, acordadas pela comunidade de nações. Eles argumentam que o comércio serve ao interesse da nação e, portanto, tais vínculos não colidem com o pensamento nacionalista ou populista que coloca o interesse nacional em primeiro lugar.

Entretanto, esses isolacionistas têm problemas com pessoas que colocam ideais acima de interesses. Não entendem intervenções internacionais que vão além do mero comércio, e especialmente as que envolvem conflitos, sacrifícios e despesas. Para eles, o não intervencionismo representa os melhores interesses da nação e de seus cidadãos.

Assim, os isolacionistas se opõem a que se procure impedir a agressão injusta de uma nação contra outra se não houver perigo imediato para seu próprio país. Eles podem se opor à formação de potências mundiais e consideram a hegemonia exercida por pesos pesados como abuso de influência e poder. Acham que o mundo sem isso seria um lugar melhor para que as nações pudessem operar como bem entendessem.

O ideal nacionalista equivocado, que favorece o isolacionismo e o não intervencionismo, vê as relações internacionais apenas como um exercício da vontade soberana de uma nação, e não como a aplicação de princípios morais universais. Para os nacionalistas, o direito internacional é uma mera concessão que a nação soberana faz com base em políticas pragmáticas determinadas pelas necessidades nacionais.

É do estadista inglês Lord Palmerston (1784-1865) a famosa frase: “Não temos aliados eternos nem inimigos perpétuos. Nossos interesses são eternos e perpétuos, e é nosso dever segui-los.9

Na mente dos isolacionistas, não existe uma verdadeira comunidade de nações, apenas interesses de uma ordem comercial garantida por estratégias e contratos políticos. Assim, os laços internacionais são moldados por uma perspectiva mercantilista que busca vantagens e lucros.

     6. A verdadeira natureza de uma comunidade de nações

Embora o interesse próprio seja importante, ele não pode ser o único fator determinante de como as nações interagem. A verdadeira natureza de uma comunidade de nações transcende a economia e os “interesses eternos” de Lord Palmerston.

A natureza social vibrante do homem se manifesta de forma diferente em cada nível da comunidade. A família é o mais íntimo dos relacionamentos, por meio do qual os indivíduos se identificam como membros ligados por laços de sangue e regidos pelo amor familiar.

Além da família, o homem encontra sua realização na sociedade política, sendo a nação sua expressão perfeita. Ele se identifica como cidadão e é governado pelas leis da nação.

Uma comunidade de nações é a consequência remota da natureza social do homem e constitui o círculo mais amplo e menos íntimo de suas conexões. Ela engloba as comunidades menores da família e da nação, e se estende, finalmente, à humanidade em geral. Como a família e a nação, ela também está sujeita à lei natural, que obriga o homem a fazer o bem e evitar o mal, ao interagir com outros em nível individual ou internacional.

     7. Defesa dos direitos além da família e da nação

Assim o homem, por sua natureza, se identifica com toda a humanidade. Com a mesma natureza racional e livre, todos têm certos direitos e deveres com implicações individuais e sociais.

Entre os direitos que todo homem tem, estão o direito à vida, à honra, a constituir família, e à propriedade privada. A solidariedade e a prática da justiça estão entre os deveres que obrigam a todos.10

O mais alto reconhecimento temporal desses direitos e obrigações universais se encontra em uma comunidade livre de nações. Universal, a Igreja Católica é a contrapartida espiritual dessa comunidade.

Como esses direitos e obrigações fundamentais se aplicam a toda a humanidade, eles transcendem as fronteiras nacionais. Todos os Estados são obrigados a reconhecê-los. A condição comum de ser humano dá origem a uma família de nações unidas por laços de solidariedade para buscar justiça, paz, segurança e o bem-estar geral.

     8. Razões para intervir

Essa verdadeira solidariedade que une a humanidade convida as nações a intervir individual ou coletivamente em momentos de necessidade, para prestar ajuda material, diplomática ou militar.

As ocasiões de intervenção incluem desastres naturais, pirataria, escravidão, genocídio, perseguição religiosa ou opressão ideológica. As nações devem se manifestar e, se possível, agir, sempre que o princípio básico da lei natural, “fazer o bem e evitar o mal”, for violado de forma chocante.

Por exemplo, um desastre natural é um caso de necessidade que conclama a comunidade de nações a deixar de lado suas diferenças para ajudar a nação afetada na medida do possível. A humanidade da população devastada exige que as outras façam sacrifícios para ajudá-la, não por qualquer ganho monetário, mas porque é a coisa certa a fazer.

Da mesma forma, as nações devem ajudar a defender outras nações contra agressões injustas. Para isso, podem assinar tratados de defesa de longo prazo para ajudar a impedir que adversários violem os direitos dos países membros. Podem, também, fornecer à nação vítima apoio moral, ajuda humanitária direta, reforço diplomático e até mesmo intervir econômica e militarmente para socorrê-la.

Dependendo de seus meios e das circunstâncias, as nações são moralmente obrigadas a apoiar as causas justas de outras nações, mesmo quando essa assistência não lhes traga benefícios financeiros diretos.

Portanto, é bom e justo que existam grandes potências dominantes que possam estender sua proteção e ajuda às nações mais fracas. Quando ocorre um desastre natural, as nações mais potentes não se sentem sobrecarregadas com o esforço de enviar equipes de resgate ou ajuda humanitária, e podem responder generosamente. No caso de um ataque injusto, podem também opor-se às potentes nações agressoras com meios proporcionais, pois ninguém mais o faria.

     9. Garantir a paz internacional

Tais intervenções contra nações agressoras beneficiam a todos, contribuindo para a paz geral.

O Papa Pio XII declarou: “Por solidariedade, as nações têm o dever de não abandonar um povo agredido. A segurança de que esse dever não deixará de ser cumprido servirá para dissuadir o agressor e, assim, evitar a guerra ou, na pior das hipóteses, pelo menos abreviar seu sofrimento.11

Assim, uma comunidade de nações vinculadas por solidariedade mútua garante a preservação do conjunto. A liberdade e a independência de qualquer estado-membro ameaçado por uma agressão injusta tornam-se preocupação de todos. O filósofo católico Luigi Taparelli d’Azeglio, S.J. (1793-1862) afirma: “A defesa da nação oprimida não é apenas um dever de benevolência para com os povos vizinhos. Para eles, trata-se também de uma questão de interesse nacional e de salvação pública”.12

Quanto maiores os recursos de uma nação, menos ela pode se esquivar de seu dever moral de defender a justiça e a paz na comunidade das nações, especialmente diante de adversários fortes.

As que desejam a paz, devem intervir empregando as opções que considerem necessárias, inclusive meios diplomáticos e econômicos. Se isso não se der, a inação torna-se um convite para que a nação agressora ataque impunemente as mais fracas. “Quando os homens maus se unem, os bons devem se associar”, escreveu Edmund Burke. “Caso contrário, cairão um após outro — sacrifício sem piedade em luta desprezível.”13

O não-intervencionismo limita perigosamente as opções estratégicas de um país, ao privar a diplomacia da força militar, que às vezes deve ser usada para negociar e garantir a paz internacional. Na foto, imagens do conflito criado pela Rússia contra a Ucrânia.

     10. Rejeitar uma política externa não intervencionista

Portanto, uma política externa de não intervenção deve ser rejeitada. Ela representa uma falta de caráter moral ao deixar de denunciar e reprimir a injustiça; corrói e destrói os laços de solidariedade que dispõem as nações a se sacrificarem pelo bem de sua comunidade; consagra o egoísmo como bem supremo.

O Papa Pio IX (1846-1878) condenou a política de não intervenção, apresentando a perspectiva católica: “Não podemos deixar de deplorar… esse princípio nefasto e pernicioso que chamam de não intervenção, proclamado por certos governos há pouco tempo, tolerado por outros, e usado até mesmo quando se trata da agressão injusta de algum governo contra outro. Contra as leis divinas e humanas, esse princípio parece destinado a aprovar a impunidade e dar licença para agredir e adulterar os direitos de outrem, suas propriedades, e até mesmo as próprias nações. É exatamente isso que estamos vendo acontecer nestes tempos enlutados.14

Heinrich Rommen observa: “A adesão estrita ao princípio de não intervenção estabelece o princípio de que, na vida internacional, a força predomina sobre o direito ao conferir um prêmio material à violação da ordem internacional.15

De fato, o não-intervencionismo limita perigosamente as opções estratégicas de um país, ao privar a diplomacia da força militar, que às vezes deve ser usada para negociar e garantir a paz internacional.

     11. A Comunidade das Nações não é uma construção artificial

Os isolacionistas geralmente se opõem à noção de uma comunidade de nações porque acham que ela ameaça a soberania nacional. Entretanto, eles se esquecem de que a natureza social do homem exige essa comunidade de nações, que está em consonância com a lei natural e é regulada por ela. Não se trata de uma criação artificial através de tratados, como as Nações Unidas ou órgãos semelhantes, que tendem a reivindicar poderes de governança mundial.

A comunidade de nações é uma estrutura natural de coordenação, não de subordinação. Ela não absorve a liberdade e a independência de seus países-membros, mas as reforça. É um desenvolvimento orgânico que não se baseia em um sistema administrativo, mas na aceitação cooperativa, por parte dos Estados-membros, das obrigações internacionais decorrentes da lei natural. Ela nasce da benevolência, pela qual nações com ideias semelhantes desejam naturalmente a existência política e o bem de todas as sociedades amigas.

Essa comunidade de nações pode se manifestar de forma legal, diplomática e comercial; pode ser escrita ou não, formal ou informal. Seus fundamentos se baseiam na natureza humana. Ela é definida e governada pela lei natural e aperfeiçoada pelos princípios morais cristãos.

     12. Os princípios cristãos enriquecem a solidariedade das nações

A solidariedade das nações é especialmente enriquecida quando informada por normas cristãs. Em sua carta apostólica Annum ingressi sumus, de 1902, o Papa Leão XIII lamentou que a teoria moderna do direito internacional excluísse as normas cristãs, que tinham o maravilhoso poder de unir as nações para formar uma família, como se viu na Cristandade.16

Essa capacidade de unir as nações vem da noção cristã da natureza humana, que derrubou os sombrios e distorcidos conceitos de humanidade encontrados no paganismo, repletos de superstição e escravidão.

O cristianismo mudou fundamentalmente as coisas ao ensinar que todos os homens, em todas as nações, são feitos à imagem e semelhança de Deus e foram redimidos por Cristo na Cruz. Portanto, todos devem ser tratados com respeito e dignidade. Além disso, Cristo conclamou todos a estender uma caridade desinteressada ao próximo.17

O triunfo dessa perspectiva cristã, tão estranha ao mundo pagão, perdura até hoje. Sobrevive especialmente no que é vagamente descrito como o Ocidente. Seus sistemas jurídicos ainda contêm uma forte influência dos preceitos cristãos, apesar de todas as tentativas contemporâneas de eliminá-los.

Todas as nações que ainda respeitam o Estado de Direito refletem essa influência duradoura das políticas ocidentais baseadas na visão cristã da dignidade da humanidade redimida e dos direitos decorrentes da natureza humana. Essa perspectiva serve como uma cola que une as nações em solidariedade. É também o alvo de nações agressoras, com um ódio especial pelo Ocidente e pelas normas católicas que o fundamentaram.

Na medida em que as nações abandonam os resquícios desses preceitos cristãos, o cenário internacional é dominado pela política de poder de uma ordem hobbesiana brutal, em que o interesse próprio levanta nação contra nação e a sociedade se torna “uma guerra de cada homem contra cada homem”.18

     13. Conclusão: O isolacionismo frustra a natureza social do homem

Para resumir esta primeira seção, o perigo do isolacionismo reside no fato de ele frustrar a necessidade vibrante do homem de aperfeiçoar sua natureza essencialmente social e de seguir a lei natural escrita em seu coração de “fazer o bem e evitar o mal” (Romanos 2:15).

Esse perigo está contido no brado dos individualistas, que fazem de seus desejos a medida de todas as coisas. Os isolacionistas tomam decisões semelhantes ao não reconhecerem a solidariedade das nações e ao limitarem suas preocupações aos “interesses eternos e perpétuos” de Lord Palmerston.

Portanto, todas as nações, especialmente as que observam o Estado de Direito, têm a obrigação moral de solidariedade de ajudar as nações necessitadas, olhando além do seu próprio interesse, pois tais nações têm o direito de esperar ajuda externa quando em perigo.

Essa obrigação inclui o direito e o dever de intervenção, dependendo dos meios e das circunstâncias de cada nação. As potências mundiais podem ser particularmente úteis ao fornecer apoio suficiente para ajudar a evitar situações históricas em que “a força faz o direito”. A solidariedade das nações é aperfeiçoada pelos preceitos cristãos, que elevam o debate ao considerar os direitos decorrentes da natureza humana e a dignidade inerente à humanidade redimida.

Navios americanos e ingleses vigiam o Estreito de Ormuz em consequência dos ataques terroristas vindos do Iêmen

B – O realismo na política externa e a missão histórica dos Estados Unidos

Com base nesses ideais cristãos universais que devem informar a política externa de uma nação, precisamos agora analisar como aplicá-los na atual situação dos Estados Unidos e do mundo. É preciso considerar os meios e as condições necessárias para implementar uma política prudente de interação com outras nações.

A sabedoria prática deve sempre prevalecer. Acima de tudo, os meios a se empregar não devem ser restritos à mera ação militar. Em geral, a diplomacia, as sanções econômicas e a influência da opinião pública mundial mostram-se suficientes para obter excelentes resultados.

É preciso ter também uma clara compreensão das condições que determinam quando se deve agir e intervir. Qualquer ação deve ser proporcional à ocasião, pois não é possível intervir ou resolver toda e qualquer injustiça.

Os esforços dos Estados Unidos não devem ser exercidos de forma indiscriminada e incondicional. Não se devem repetir os erros do passado.

É preciso, acima de tudo, analisar o papel dos Estados Unidos no mundo diante da pressão para que adote políticas não intervencionistas e isolacionistas.

As diretrizes a seguir oferecem algumas orientações para o futuro.

     1. O papel dos Estados Unidos no mundo real contradiz o isolacionismo

O poder econômico e militar dos Estados Unidos lhes confere um papel de liderança no mundo. As vastas redes comerciais do país e a defesa do Estado de Direito tornam sua participação na economia mundial essencial para a proteção do comércio global. A maioria das nações depende desse comércio e se beneficia de sua proteção, devendo contribuir para isso.

Uma diminuição significativa da liderança americana representaria um grande transtorno para o comércio mundial.

Os vastos recursos e a determinação política dos Estados Unidos fazem deles a única nação ainda capaz de responder proporcionalmente às graves ameaças daqueles que querem perturbar a ordem internacional, especialmente atacando nações mais fracas. Por outro lado, sua posição de potência faz dos Estados Unidos um país essencial para garantir e formar coligações com outras nações dispostas a se opor a tais ameaças. Qualquer recuo importante nesse papel de liderança terá consequências graves e imediatas.

Os Estados Unidos têm um papel semelhante cumprindo a lei natural no tocante à solidariedade devida para com as demais nações. Os Estados Unidos devem usar os vastos recursos que Deus lhes deu para se opor às injustiças perpetradas por nações agressoras.19 Seu exemplo serve de inspiração para que outros ajudem neste sentido. Os Estados Unidos não devem assumir, mas compartilhar, o ônus de defender os direitos humanos no âmbito universal, bem como os deveres comuns a todos. Portanto, sua não intervenção afetaria negativamente a segurança mundial.

De uma perspectiva realista, a adoção do isolacionismo pelos Estados Unidos deixaria um vazio que só beneficiaria nações agressoras. Se eles se ausentassem do cenário mundial, dariam azo a uma situação em que o direito da força substituiria a força do direito, na qual nações mal intencionadas poderiam agir impunemente.

s Pais Fundadores assinam a Constituição dos EUA – Howard Chandler Christy (1873–1952). Capitólio dos Estados Unidos.

Os Pais Fundadores dos EUA foram isolacionistas? A história afirma que não

 Um dos argumentos apresentados para apoiar o isolacionismo é a alegação de que os pais fundadores dos Estados Unidos insistiam para que o país não se envolvesse em conflitos externos. Entretanto, uma leitura cuidadosa da história da jovem república norte-americana revela uma história diferente. Os primeiros governantes do país se deram conta de que, num mundo cheio de perigos, nada substitui uma defesa forte e uma diplomacia ativa, bem como a disposição de intervir quando necessário para garantir a paz.

Um estudo de 2013, realizado por Marion Smith, rastreia os primeiros 70 anos da política externa americana e mostra, sem sombra de dúvida, que os primeiros líderes políticos dos Estados Unidos conseguiram equilibrar o idealismo dos princípios norte-americanos com o realismo das situações que exigiam ação e intervenção. 

“Os princípios constitucionais dos Estados Unidos não exigem isolacionismo”, conclui Smith, “e os Pais Fundadores não implementaram uma política externa não intervencionista” (Marion Smith, “The Myth of American Isolationism: Commerce, Diplomacy, and Military Affairs in the Early Republic”, Heritage.org, 9 de setembro de 2013, https://www.heritage.org/political-process/report/the-myth-american-isolationism-commerce-diplomacy-and-military-affairs-the.)

     2. Condições para se exercer uma solidariedade realista

Para garantir a eficácia de qualquer ajuda a outras nações, os Estados Unidos devem observar certas condições que reflitam uma perspectiva mundial realista.

(a) Ajudar os amigos, não os inimigos

Os Estados Unidos devem ajudar as nações dispostas a ajudá-los a promover a paz, a segurança e o bem-estar da comunidade de nações, especialmente as que o ajudam a defender o Ocidente. Os Estados Unidos devem trabalhar arduamente no campo diplomático, cultural e econômico para expandir essa “coligação dos dispostos”.

A política externa norte-americana deve ser orientada para fortalecer alianças contra ameaças identificadas. Os Estados Unidos devem trabalhar de forma harmoniosa com seus aliados, compartilhando recursos e ativos no maior grau possível.

Por outro lado, o país nunca deve ajudar nações que trabalham para minar os próprios Estados Unidos e o Ocidente. É errado tratar amigos e inimigos em pé de igualdade.

Portanto, uma sábia política externa que ajude amigos e inimigos é o oposto da que tem sido seguida por governos republicanos e democratas por muitas décadas. Essa política externa equivocada permitiu que trilhões de dólares em negócios e lucros fossem despejados na China Vermelha, ajudando-a a se tornar o agente desestabilizador e a grande ameaça existencial para os Estados Unidos e o mundo, como o é atualmente.

A ajuda aos amigos deve levar especialmente em conta a importância estratégica de desenvolver laços com as nações latino-americanas. Sendo todos vizinhos, os países da comunidade de nações dessa parte do Hemisfério Ocidental devem ser aliados naturais. Sendo também cristãos, compartilham naturalmente as noções de solidariedade que tanto contribuem para formar uma política externa ideal.

Nas últimas décadas, a política externa equivocada do Ocidente permitiu que trilhões de dólares em negócios e lucros fossem despejados na China Vermelha, ajudando-a a se tornar o agente desestabilizador e a grande ameaça existencial para os Estados Unidos e o mundo, como o é atualmente

(b) Evitar utopias e ater-se a metas bem definidas

Os isolacionistas argumentam que, no passado, os Estados Unidos promoveram ideais errados e perseguiram objetivos mal definidos que produziram maus resultados. Ora, quaisquer falhas, verdadeiras ou falsas, jamais poderiam validar o abandono da solidariedade à comunidade das nações exigida pela lei natural.

A solução é perseguir ideais adequados e adotar métodos e estratégias realistas com objetivos sábios e bem definidos. Portanto, os Estados Unidos devem evitar guerras sem objetivos claros. O objetivo de qualquer luta contra a injustiça só pode ser uma vitória cabal e decisiva.

Deve-se também evitar de promover ideais utópicos, tais como a noção vagamente definida de “disseminar a democracia” ou “expandir a liberdade”, especialmente quando não fundamentada na realidade.

(c) Uma política externa norte-americana “non-woke”

Os Estados Unidos devem livrar sua política externa de ideias esquerdistas nocivas e buscar princípios saudáveis que contribuam para o bem da comunidade das nações. Os ideais existentes na natureza humana, definidos pela lei natural e aperfeiçoados pelos princípios cristãos, são os melhores critérios para verificar se uma causa é justa ou não.

Assim, os Estados Unidos erram ao seguir uma política externa que favorece agendas esquerdistas vinculando sua ajuda à aceitação do aborto provocado e às ideologias “woke” ou LGBTQ. Além disso, grandes setores do público americano se opõem a esse uso imoral da ajuda externa como arma para impor políticas errôneas.

As nações que recebem ajuda devem rejeitar tais ameaças, pois subvertem a moralidade de suas populações. Ao fazê-lo, elas praticam a solidariedade por serem um exemplo para os Estados Unidos e outras nações beneficentes, mostrando que são povos com princípios que agem corretamente ao colocar a retidão moral acima de seus interesses financeiros.

(d) Voltando às raízes de uma política sadia

A ordem democrática liberal está esgotada. As pessoas geralmente procuram resolver problemas e encontram soluções voltando às suas próprias raízes.

Assim, quanto mais caótico e desesperado o mundo se tornar, maior terá necessidade de adotar políticas externas baseadas na lei natural perene, aplicável a todos os povos e em todas as épocas e lugares, e aos princípios cristãos. Esse retorno aperfeiçoará a solidariedade que os Estados Unidos devem praticar.

Até que o façam, os Estados Unidos verão que seus esforços sempre serão insuficientes.

     3. Não podemos nos desvencilhar dos problemas mundiais

É ingênuo pensar que os Estados Unidos podem simplesmente abandonar sua hegemonia e se concentrar em melhorar as condições de vida no cenário doméstico sem serem incomodados. Ao longo da História, nações desonestas sempre trabalharam contra o bem comum da comunidade de nações. Por exemplo, ideologias malignas como o comunismo manifestam-se por meio de regimes agressivos que violam os direitos humanos mais básicos.

Diz-se que “a natureza tem horror ao vácuo”. Alguma coisa ou alguém sempre preencherá os espaços deixados vazios. Quando nações fortes se retiram da liderança, impérios malignos tomam seus lugares.

O momento atual não é exceção a essa regra. Muitos falam de um nascente mundo “multipolar” que surge para desafiar o Ocidente e estabelecer um estado de coisas antagônico. O pensador católico brasileiro Plinio Corrêa de Oliveira previu uma “luta de classes das nações” entre o Sul Global/Terceiro Mundo e o Norte Industrializado/Primeiro Mundo, que substituiria os modelos marxistas fracassados.20

Uma visão realista deve identificar áreas de preocupação e procurar as melhores maneiras de responder a essas ameaças.

     4. Ameaças que exigem atenção

Essas áreas de preocupação exigem atenção, pois estão ativamente envolvidas em ações que violam a segurança, a paz e o bem-estar da comunidade das nações. Elas conclamam a que se adotem o idealismo da solidariedade e o realismo de tomar medidas concretas.

(a) A China imperialista e comunista

A China comunista é especialmente uma ameaça à paz e à segurança mundiais. Ela continua a seguir despudoradamente sua tóxica ideologia marxista, tão prejudicial à humanidade. Beneficiada pela transferência maciça de riqueza e tecnologia ocidentais, a China procura realizar suas ambições imperialistas de ser grande potência econômica e militar, fazendo alianças comerciais, diplomáticas e militares com todos os inimigos dos Estados Unidos e do Ocidente. Para dar um exemplo, a Rússia tornou-se um estado vassalo da China Vermelha e representa uma ameaça real na medida em que continua a receber sua ajuda.

(b) A Rússia Putinista-Duginista

As duas invasões injustas da Ucrânia (em 2014 e 2022) por forças russas numericamente superiores merecem a maior preocupação. A Rússia busca declaradamente aniquilar a Ucrânia como nação e erradicar a fé dos católicos.21

Além disso, a Rússia é guiada por uma política externa chamada de “Quarta Teoria Política”, que defende uma suposta “multipolaridade” ao mesmo tempo em que congrega todos os países hostis ao Ocidente.22

(c) O Comunismo

Além disso, o mundo ainda enfrenta a praga da ideologia comunista, que espalha seus erros por meio de Cuba, Coreia do Norte, Venezuela, Nicarágua e outros. O Mundo Livre deve combater esse erro que tem espalhado tanto ódio e miséria ao longo da História.

Não devemos nos esquecer de que essa ideologia é responsável pela morte de dezenas de milhões de pessoas. Os regimes comunistas continuam a perseguir a Igreja. Os projetos expansionistas da seita vermelha na América Latina e em lugares como Taiwan e Coreia do Sul devem ser combatidos por todos os meios possíveis.

(d) Irã e islamismo

O islamismo e sua jihad também buscam a destruição do Ocidente e da Igreja. Guerras e conflitos na África e na Ásia estão causando a morte e o martírio de inúmeros cristãos, cujo sangue clama pela solidariedade de todas as nações para por fim a essa calamidade.23

O fator unificador dessas quatro ameaças é seu foco antiocidental e anticatólico. Na verdade, seu alegado caráter multipolar é bipolar, pois as quatro ameaças se unem como uma só contra os Estados Unidos, o Ocidente e a Igreja.

     5. O alto preço do fracasso

Um fracasso dos Estados Unidos em defender a si mesmos e ao Ocidente contra essas ameaças terá consequências drásticas, lançando o mundo em crises e caos ainda maiores.

Por mais que as pessoas queiram ignorar o mal, o mundo atual tornou-se um lugar muito perigoso. Os Estados Unidos enfrentam inimigos que não podem ser ignorados e nem se apaziguarão com concessões, que devem ser evitadas a todo custo. O fracasso teria um alto preço. A situação atual exige ações que vão além do interesse próprio, e os Estados Unidos se encontram bem preparados para essa tarefa.

     6. Abracemos o dever com total confiança na ajuda divina

Abençoados pela Divina Providência com abundância, os Estados Unidos sempre foram uma nação generosa, disposta a socorrer os necessitados, mesmo à custa de grande esforço e sacrifício, inclusive de vidas.

No entanto, para carregar este grande fardo, os Estados Unidos devem rogar a Deus que lhes conceda força e ajuda. A crise atual traz à lembrança as palavras de Nossa Senhora de Fátima em 1917, alertando sobre futuras guerras e perseguições, e prometendo a ajuda celestial e o Seu triunfo final.

Ao esposarem o ideal da solidariedade entre as nações e rejeitarem com realismo as causas esquerdistas e as metas e estratégias utópicas, depositando sua confiança em Deus e em Sua Mãe Santíssima, os Estados Unidos podem frear e deter o ameaçante deslize do mundo em direção ao caos.

A nobre disposição dos Estados Unidos de ajudar outras nações faz lembrar as palavras de Pio XII, que escreveu após a Segunda Guerra Mundial: “O povo americano tem um grande gênio para ações esplêndidas e altruístas. Deus colocou nas mãos dos Estados Unidos os destinos de uma humanidade aflita.24

Este não é o momento para isolacionismo, mas para levar a cabo uma ação altruísta que só será eficaz se os Estados Unidos se voltarem internamente à ordem e se colocarem nas mãos de Deus com total confiança em Sua ajuda.

22 de agosto de 2024

A TFP Americana


Notas:

1. Ver Victor Cathrein S.J., Philosophia moralis, ed. (Barcelona: Herder, 1945), nº 745, 506-507, . John Schuster, 11th ed. (Barcelona: Herder, 1945), nº 745, 506-507, https://archive.org/details/philosophiamoral0000cath/mode/2up.
2.“A vida social é necessária para a prática da perfeição” – São Tomás de Aquino, Summa Theologiae, II-II, q. 188, a. 8. https://www.newadvent.org/summa/3188.htm#article8.
3. Heinrich A. Rommen, The State in Catholic Thought: A Treatise in Political Philosophy (St. Louis: B. Herder Book Co., 1945), 136-37, https://archive.org/details/stateincatholict00rommrich/mode/2up.
4. Rommen observa que os anacoretas e eremitas são exceções a essa regra embora não estejam isolados, pois vivem em estreita comunidade com Deus e os santos. Ver Rommen, The State in Catholic Thought, p. 137.
5.“A essas sociedades pertencem, em primeiro lugar, a família, o Estado e também a Sociedade dos Estados, porque o bem comum, o fim essencial de cada uma delas, não pode existir nem ser concebido sem sua relação intrínseca com a unidade do gênero humano. A esse respeito, a união indissolúvel dos Estados é um postulado natural, é um fato que se impõe a eles e ao qual eles, embora às vezes hesitantes, se submetem como se fossem a voz da natureza, esforçando-se também para dar à sua união uma regulamentação externa estável, uma organização. O Estado, a Sociedade de Estados e sua organização são, portanto, por sua própria natureza, de acordo com a natureza social do homem, e apesar de todas as sombras, como atesta a experiência histórica, são formas de unidade e ordem entre os homens, necessárias à vida humana e cooperando em sua perfeição. Seu próprio conceito diz tranquilidade na ordem, aquela ‘tranquillitas ordinis’ que é a definição de paz de Santo Agostinho: elas são essencialmente uma ordenação da paz”. Pio XII, Mensagem radiofônica de Natal (24 de dezembro de 1951), no. II, Vatican.va, https://www.vatican.va/content/pius-xii/it/speeches/1951/documents/hf_p-xii_spe_19511224_natale.html.
6. “Os povos cristãos formam uma verdadeira família, no sentido mais genuíno da palavra. A família resulta, antes de tudo, de uma certa comunidade de vida entre seus membros, recebida da mesma fonte, do mesmo tronco genealógico. A Cristandade tem também uma comunidade de vida, a vida da graça, a vida sobrenatural que faz de cada fiel um filho adotivo de Deus. A comunidade de vida cria obrigações, na família e na Cristandade. Na Família a defesa dos ancestrais, de que todos receberam a vida natural, a defesa dos parentes, em cujas veias corre o mesmo sangue. Na Cristandade, a defesa de Nosso Senhor Jesus Cristo e de Seu Corpo Místico. Na família, todos devem trabalhar para o ideal comum. Na Cristandade todos devem cooperar para a dilatação do Reino de Cristo. O conceito de Cristandade é uma projeção, no terreno natural, da grande realidade sobrenatural que é o Corpo Místico de Nosso Senhor Jesus Cristo”. Plinio Corrêa de Oliveira, “Cristandade”, Legionário, 18 de agosto de 1946, nº 732, https://www.pliniocorreadeoliveira.info/LEG%20460818_Cristandade.htm .
7.“A lei das nações (ius gentium) diz claramente que os viajantes podem comerciar desde que não causem dano aos cidadãos, e . . . da mesma forma, pode-se provar que isso é lícito na lei divina. Portanto, qualquer decreto humano (lex) que proibisse tal comércio seria indubitavelmente irracional.” Francisco de Vitoria Political Writings, ed., Anthony Pagden e Jeremy Lawrance. Anthony Pagden e Jeremy Lawrance (Cambridge, Reino Unido: Cambridge University Press, 1991 [2001]), 279-80.
8. De acordo com a noção de que a Terra pertence a todos, os indivíduos têm o direito de migrar para outras nações. Entretanto, eles devem respeitar as normas e os direitos de seus países anfitriões. O direito de migrar nada tem a ver com a atual migração em massa ilegal e irrestrita que subverte as leis, os costumes e a soberania das nações anfitriãs.
9. Visconde Palmerston, Intervention in Parliamentary Debate, “Treaty of Adrianople-Charges Against Viscount Palmerston,” House of Commons, Debates, 1 de março de 1848, vol. 97 cc 66-123, https://api.parliament.uk/historic-hansard/commons/1848/mar/01/treaty-of-adrianople-charges-against.
10.“O primeiro desses erros perniciosos, hoje largamente difundidos, é o esquecimento daquela lei de caridade e solidariedade humana, sugerida e imposta, quer pela identidade de origem, e pela igualdade da natureza racional em todos os homens, sem distinção de povos, quer pelo sacrifício da redenção oferecido por Jesus Cristo sobre a cruz ao Pai celeste em favor da humanidade pecadora…”À luz desta unidade de direito e de fato de toda a humanidade, os indivíduos não nos aparecem desligados entre si, como grãos de areia; mas sim unidos por relações, diversas com o variar dos tempos, mas orgânicas, harmoniosas e mútuas, por natural e sobrenatural destino e impulso.” Pio XII, encíclica Summi pontificatus (20 de outubro de 1939), nos. 27 e 33. https://www.vatican.va/content/pius-xii/pt/encyclicals/documents/hf_p-xii_enc_20101939_summi-pontificatus.html.
11. Pio XII, “Mensagem radiofônica de Natal, 24 de dezembro de 1948, https://www.vatican.va/content/pius-xii/it/speeches/1948/documents/hf_p-xii_spe_19481224_un-tempo.html.
12. Luigi Taparelli d’Azeglio, S.J, Essai theorique de droit naturel: Basé sur les faits, 2nd ed. (Tournai, França: Vve. H. Casterman, 1875), no. 1263, 2:13, https://archive.org/details/essaithorique02tapa/page/13/mode/1up.
13. Edmund Burke, “Thoughts on the Cause of the Present Discontents”, 3ª ed. (Londres: J. Dodsley, 1770), 106, https://archive.org/details/thoughtsoncause00burkgoog/page/n120/mode/2up.
14. Pio IX, Alocução “Novos et ante” (28 de setembro de 1860), Vatican.va, acessado em 6 de agosto de 2024, https://www.vatican.va/content/pius-ix/it/documents/allocuzione-novos-et-ante-28-settembre-1860.html. Pio IX reiterou esse ensinamento em seu Syllabus of Errors de 1864, anexado à encíclica Quanta cura. Na seção 7, ele condenou o erro nº. 62, traduzido da seguinte forma: “O princípio da não intervenção, como é chamado, deve ser proclamado e observado.” Pio IX, Syllabus of Errors (8 de dezembro de 1864), acessado em 6 de agosto de 2024, https://maryourhelp.org/e-books/papal-encyclicals/pius_ix_pope_quanta_cura_and_the_syllabus_of_errors.pdf.
15. Rommen, The State in Catholic Thought, 639-40.
16. Cfr. Leão XIII, Carta Apostólica “Annum ingressi sumus” (19 de março de 1902), The American Catholic Quarterly Review 27, no. 107 (julho de 1902): 589, https://archive.org/details/americancatholic27philuoft/page/589/mode/1up.
17. Veja, por exemplo, a parábola do Bom Samaritano (Lucas 10:25-37).
18. Thomas Hobbes, “Leviatã”, ed. Nelle Fuller, em Machia, EUA. Nelle Fuller, em Machiavelli, Hobbes, vol. 23 of Great Books of the Western World, 86.
19. O ensinamento de Cristo deixa este dever ainda mais claro: “E a qualquer que muito for dado, muito se lhe exigirá, e ao que muito se lhe confiou, muito mais se lhe pedirá” (Lucas 12:48).
20. Ver Plinio Corrêa de Oliveira, Revolução e Contra-Revolução, https://www.pliniocorreadeoliveira.info/RCR.pdf.
21. Cfr. “Statement of the Permanent Synod of the UGCC in Light of the Interview of Pope Francis Conducted by Radio Télévision Suisse,” UGCC.ua, 10 de março de 2024, https://ugcc.ua/en/data/statement-of-the-permanent-synod-of-the-ugcc-in-light-of-the-interview-of-pope-francis-conducted-by-radio-tlvision-suisse-955/. Ver também James Bascom, “Seven Reasons Why America Must Help Ukraine Defend Itself,” TFP.org, 10 de abril de 2024, https://www.tfp.org/seven-reasons-why-america-must-help-ukraine-defend-itself/.
22. A injusta guerra de agressão da Rússia é guiada pela influência do filósofo Aleksandr Dugin, que reinvindica uma “Quarta Teoria Política” que consiste em construir a “multipolaridade” e representa o triunfo de filosofias esotéricas, modelos pagãos e ideologias esquerdistas recicladas que moldariam uma ordem mundial antiocidental. Cfr. John Horvat II, “Trying to Explain Alexander Dugin,” TFP.org, 21 de fevereiro de 2023, https://www.tfp.org/trying-to-explain-alexander-dugin/.
23. Ver Luiz Sérgio Solimeo, Islam and the Suicide of the West: The Origin, Doctrine, and Goals of Islam (Spring Grove, Penn.: The American Society for the Defense of Tradition, Family and Property, 2018), https://www.tfp.org/islam-and-the-suicide-of-the-west-origins-doctrines-and-goals-of-muhammads-religion/.
24. Pio XII, “Wisdom-Not Weapons of War”, Collier’s Weekly, 5 de janeiro de 1946, p. 13, acessado em 6 de agosto de 2024, https://www.unz.com/print/Colliers-1946jan05-00011. Em um discurso sobre política externa no Hudson Institute em 8 de julho de 2024, o presidente da Câmara de Representantes, Mike Johnson, usou essa citação papal feita em um discurso de Ronald Reagan em 1974. Ver “Speaker Mike Johnson on the Threats to the US-Led World Order”, Hudson Institute, 8 de julho de 2024, https://www.hudson.org/events/speaker-mike-johnson-threats-us-led-world-order-rebeccah-heinrichs.