Práticas de piedade atuais

  • Cristiano Martins da Costa

Atualidade encoberta. No primeiro artigo da presente série de três, de forma sucinta embora, foram realçadas duas características centrais — reparação e desagravo — da devoção ao Sagrado Coração de Jesus que se propagou universalmente a partir das revelações de Paray-le-Monial (1673-1675). Jamais deverão ser esquecidas ou subestimadas no espírito dos fiéis; estão na origem (ou foram estímulo) de um conjunto de práticas de piedade que têm marcado a vida da Igreja por séculos e sobre algumas das quais falaremos a seguir. Trata-se agora de jogar luz intensa sobre tais formas de culto, mostrar sua atualidade, aproveitando o quadro de fundo das comemorações do 350º aniversário de tais aparições e a ampla divulgação da encíclica “Dilexit vos” do Papa Francisco. Trazendo para o centro algumas das principais, embora certos círculos as possam preferir encobertas por julgá-las arcaicas e obsoletas, apenas as colocamos onde sempre deveriam estar, fulgurando virtude para todos.

Foco na Comunhão nas Nove Primeiras Sextas-feiras do mês. Também intitulada Comunhão Reparadora. É hábito piedoso que o fiel faça sua confissão poucos dias antes de comungar. E igual, se possível, comungue durante a assistência à Missa. Deve receber a comunhão nas nove primeiras sextas-feiras durante nove meses consecutivos. Esta prática é denominada com razão de “a grande promessa”. Emergindo das aparições de Paray-le-Monial [foto acima], contém a promessa da perseverança final: “Eu te prometo, na excessiva misericórdia de meu coração, que meu amor onipotente concederá a todos os que comunguem nas primeiras sextas-feiras de mês, durante nove meses consecutivos, a graça da penitência final, e que não morram em minha desgraça, nem sem receber os Santos Sacramentos, assegurando-lhes minha assistência na hora final. para aqueles que a realizarem com intenção reta”. Contudo, a primeira Sexta Feira do mês é ocasião para outras práticas de piedade além da Nove Comunhões Reparadora. Com efeito, na primeira sexta-feira do mês convém ao fiel se lembrar de que ela é dedicada ao Sagrado Coração de Jesus e é dia de atenção especial ao perdão dos pecados. Para fortalecer os bons propósitos neste dia pode-se outrossim rezar a Ladainha, a Consagração, o Ato de Reparação ao Sacratíssimo Coração de Jesus e a Oração ao Coração de Jesus na Eucaristia — estão na rede. Pio XI ensina, a oração deve ser “humilde, confiante e perseverante”. Continua o Pontífice: “A nenhuma outra obra piedosa foram feitas pelo Senhor Onipotente promessas tão abundantes, tão universais e tão solenes”. Bastaria a fidelidade às práticas das primeiras Sextas-Feiras para mudar para muito melhor o clima no interior da Igreja, oxigenando-o, e abrir enormes perspectivas missionárias. Teríamos práticas mais atuais e eficazes? E, ao mesmo tempo, são singelas, simples, ao alcance da mão.

O retorno das consagrações. De outro modo, faz falta o regresso de prática que jamais deveria ter sido virtualmente abandonada, pelo menos em círculos influentes. A consagração ao Sagrado Coração é decorrência lógica do propósito de reparar. Pela consagração, percorrendo o austero caminho da dedicação, é desagravado o Sagrado Coração, esbofeteado em seus direitos. Enquanto é particular a prática das primeiras Sextas-Feiras do mês, a consagração tanto pode ser particular como envolver sociedades. De um lado, uma pessoa pode se consagrar privadamente e até no silêncio de sua alma. Como ilustração, deixo a seguir uma das fórmulas:

“Eu (nome), para Vos testemunhar o meu reconhecimento e reparar as minhas infidelidades, Vos dou o meu coração e me consagro inteiramente a Vós, ó meu amável Jesus, e com o vosso socorro proponho não pecar mais”.

De outro, também as sociedades, ou seja, famílias, escolas, empresas, e até mesmo Estados, podem se consagrar validamente ao Sagrado Coração de Jesus, atraindo para si sua proteção e suas bênçãos. Foi prática comum em décadas passadas, em especial no século XIX, produziu grandes frutos, balizou por décadas a direção geral da piedade católica. Ápice desse movimento foi a consagração do gênero humano feita por Leão XIII (1878-1903) em 11 de junho de 1899, em união com bispos, sacerdotes e fiéis; consagração anunciada, justificada doutrinária e pastoralmente pouco antes, em 25 de maio de 1899 na encíclica “Annum Sacrum”. Seu sucessor, São Pio X (1903-1914) [, quando ainda cardeal-patriarca de Veneza, definiu bem, com a singeleza dos santos, o objetivo da prática piedosa das consagrações, da qual era grande adepto:

“Restabelecer os direitos que Nosso Senhor possui de ser amado e servido enquanto Rei, como Ele o era nas épocas de fé”.

Na presente quadra histórica, com as circunstâncias imperantes, uma maneira factível de retomada e reconquista é a ênfase na consagração das famílias católicas, ato privado que depende apenas dos pais e, de certa maneira, dos filhos. Não nos esqueçamos, a família é a primeira e mais natural das sociedades; e, sob vários aspectos, a mais importante delas. Tudo o que acontece no interior das famílias reverbera para a sociedade inteira, por vezes de forma decisiva. Sua consagração pode ser largamente praticada e atrairá as bênçãos do Sagrado Coração para as que a ele aderirem com retidão e fé. E terá enorme repercussão social; serão ondas benfazejas, levando bênçãos, espalhando-se meio indefinidamente pelos oceanos das populações sofredoras, tantas vezes ávidas de sobrenatural.

Entronização do Sagrado Coração nos lares. É prática naturalmente complementar da consagração das famílias, que o colocam (entronizam), mediante, por exemplo, sua imagem sobre uma peanha em lugar destacado da casa. Ali fazem orações, particulares ou em conjunto, sua presença cria ambiente de elevação, pureza e respeito. O fim próximo é da entronização fazer com que o Sagrado Coração reine naquela família, ou naquele ambiente. O fim remoto é que este reino se estenda a toda a sociedade. Não estou falando aqui especificamente da Obra da Entronização, fundada pelo padre Mateus Crawley-Boevey (1875-1961), digna de todos os elogios, mas apenas da prática privada.

O bentinho do Sagrado Coração de Jesus. O bentinho, proteção contra tentações e calamidades, é um objeto de devoção que traz inscrito “Alto! O Coração de Jesus está comigo, Venha a nós o vosso Reino” [foto acima]. É muito conveniente sua mais ampla difusão; depois de bento por um sacerdote, pode ser guardado, por exemplo, na bolsa ou na carteira.

Incentivo a todas as formas de devoção. A devoção ao Sagrado Coração deve ser considerada estímulo às outras formas de devoção. Pio XII, na “Haurietis Aquas”, pontuou: “Ninguém pense que esta devoção prejudique no que quer que seja outras formas de piedade”. Contudo, pelas suas características, tem maior relação com a devoção ao Verbo Encarnado, Eucaristia, Paixão, Cinco Chagas, Nossa Senhora.

As doze promessas do Sagrado Coração de Jesus. Para fechar o presente artigo deixo abaixo as chamadas 12 promessas do Sagrado Coração, compilação piedosa feita a partir das Grandes Revelações de 1673 a 1675, cujo conhecimento (ou recordação) estimula as mais diversas formas de adoração ao Sagrado Coração.

1ª) Eu darei aos devotos do meu Coração todas as graças necessárias a seu estado.

2ª) Estabelecerei e conservarei a paz em suas famílias.

3ª) Eu os consolarei em todas as suas aflições.

4ª) Serei seu refúgio seguro na vida e principalmente na hora da morte.

5ª) Lançarei bênçãos abundantes sobre todos os seus trabalhos e empreendimentos.

6ª) Os pecadores encontrarão em meu Coração fonte inesgotável de misericórdias.

7ª) As almas tíbias tornar-se-ão fervorosas pela prática dessa devoção.

8ª) As almas fervorosas subirão, em pouco tempo, a uma alta perfeição.

9ª) A minha bênção permanecerá sobre as casas em que se achar exposta e venerada a imagem de Meu Sagrado Coração.

10ª) Darei aos sacerdotes que praticarem especialmente essa devoção o poder de tocar os corações mais endurecidos.

11ª) As pessoas que propagarem esta devoção terão o seu nome inscrito para sempre no Meu Coração.

12ª) A todos os que comungarem nas primeiras sextas-feiras de nove meses consecutivos, darei a graça da perseverança final e da salvação eterna.