Assinada pelo Instituto Plinio Corrêa de Oliveira, conjuntamente com entidades coirmãs de diversos países, abaixo reproduzimos a íntegra da respeitosa petição dirigida a Sua Santidade o Papa Leão XIV, que lhe foi entregue em Roma no dia 16 de setembro.
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Beatíssimo Padre,
Tendo em vista suas recentes e auspiciosas manifestações em defesa da família e da coerência que os católicos devem manter na vida pública ao sustentar os princípios da fé, as associações signatárias — herdeiras do pensamento e da ação do grande líder brasileiro Plinio Corrêa de Oliveira — dirigem-se filialmente a Vossa Santidade para manifestar suas apreensões quanto ao futuro da família.

Em 2015, já nos havíamos dirigido ao Papa Francisco, no período entre os dois Sínodos sobre a família, para denunciar a aliança de poderosas organizações, forças políticas e meios de comunicação que promoviam a chamada “ideologia de gênero”. Tal ideologia servia de chancela para uma revolução sexual que favorece costumes contrários à lei natural e divina. Mais grave ainda, constatávamos uma desorientação generalizada entre os católicos, “causada pela possibilidade de que se tenha aberto no seio da Igreja uma brecha que permite a aceitação do adultério — mediante a admissão à Eucaristia de casais divorciados recasados civilmente — e até mesmo uma virtual aceitação das próprias uniões homossexuais”. Em consequência, pedíamos uma palavra esclarecedora ao Papa Francisco, para “superar a crescente confusão entre os fiéis” e impedir “a relativização do próprio ensinamento de Jesus Cristo”[1].
Com o apoio subsidiário de outras entidades reunidas na coligação “Supplica Filiale al Papa Francesco sul futuro della Famiglia”, recolhemos 858.202 assinaturas entregues na Santa Sé na manhã de 29 de setembro de 2015, quase exatamente há dez anos.
Entre as assinaturas, destacavam-se as de 211 prelados (cardeais, arcebispos e bispos) e um grande número de sacerdotes e religiosos, além de numerosas personalidades civis de renome no Ocidente e em outros países. Em sua intervenção no colóquio Igreja Católica: para onde vais?, realizado em Roma em 7 de abril de 2018, o Cardeal Walter Brandmüller citou nossa petição como uma das mais evidentes manifestações do consensus fidei fidelium, exercendo papel imunizador para preservar a Igreja do erro.

Com grande dor na alma, devemos constatar que, longe de atender a esse justo pedido do rebanho, o predecessor de Vossa Santidade na Cátedra de Pedro agravou ainda mais a situação. De um lado, pelo abuso de admitir os divorciados civilmente recasados à comunhão eucarística — por meio da nota 351 da Amoris Laetitia e da aprovação pontifícia à interpretação dos bispos da Região Pastoral de Buenos Aires —; de outro, pelas declarações e gestos que legitimaram as uniões civis homossexuais, culminando com as “bênçãos pastorais” autorizadas na Declaração Fiducia Supplicans, de 18 de dezembro de 2023, assinada pelo Prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé.
Desde então, a situação continuou ainda a piorar, sobretudo no que diz respeito à aceitação das uniões e relações homossexuais. Multiplicaram-se declarações de altos prelados pedindo uma “atualização” do ensinamento da Igreja e uma mudança do Catecismo nos parágrafos que afirmam que a inclinação homossexual é “objetivamente desordenada”, que os atos homossexuais são “intrinsecamente desordenados” e que a Sagrada Escritura os apresenta como “depravações graves”.
Embora com uma linguagem aparentemente moderada, já há vozes de prelados e teólogos que pedem para “historicizar” as situações, a fim de evitar “preconceitos moralistas”, atualizando a linguagem bimilenar da Igreja e adaptando-a aos tempos atuais. É o que pensam, por exemplo, personalidades como o vice-presidente dos bispos italianos, Dom Francesco Savino[2], o arcebispo francês Dom Hervé Giraud[3] e o cardeal Jean-Claude Hollerich, arcebispo de Luxemburgo, que chegou a afirmar que o ensinamento católico sobre a homossexualidade “está errado”, uma vez que sua base sociológica e científica não seria mais válida[4].
Da mesma forma, a irmã Jeannine Gramick[5] e o padre James Martin[6] desejam suprimir a expressão “intrinsecamente desordenados”, propondo fórmulas alternativas que tendem a tornar admissível aquilo que não é admissível nem o pode ser. O Caminho Sinodal Alemão segue na mesma direção, pedindo uma revisão do Catecismo para adaptá-lo às “ciências humanas”, o que equivale a dizer que o mundo moderno tem mais autoridade do que Deus[7].
Infelizmente, há quem vá ainda mais longe, pedindo não apenas mudanças nas palavras, mas também na própria prática do ensino moral da Igreja. O cardeal Robert W. McElroy, por exemplo, nega que a matéria dos pecados sexuais seja grave, abrindo assim caminho para a legitimação e normalização da impureza[8]. Afirma também que o “acolhimento radical” dos homossexuais praticantes deve ser inclusive sacramental, ou seja, que viver objetivamente contra o mandamento divino não constituiria obstáculo para receber a absolvição e a Eucaristia[9]. O cardeal Timothy Radcliffe, depois de afirmar que o ensinamento católico é “são e bom”, dilui-o dizendo que é preciso entendê-lo com “nuances”[10] e reiterou indiretamente o que já dissera no Pilling Report, a saber, que as relações homossexuais poderiam ser compreendidas em chave eucarística, como imagem da “doação de Cristo” na comunhão[11]. O teólogo austríaco padre Ewald Volgger insiste nessa mesma linha ao dizer que as uniões homossexuais são uma imagem da solicitude divina pelos homens, o que justifica que sejam abençoadas[12]. O teólogo suíço Daniel Bogner vulnera diretamente o sacramento do matrimônio, dizendo que é preciso dar-lhe uma nova compreensão, libertando-o de sua “embalagem de perfeição”, para que as uniões irregulares e homossexuais não sejam discriminadas. Ele defende que é necessário acabar com “a fixação rígida no sexo biológico e na heterossexualidade dos cônjuges”, uma vez que “a fertilidade não deve ser entendida exclusivamente em termos de reprodução biológica”.[13]
Em vista de tudo isso, Beatíssimo Padre, não podemos deixar de concluir que, sob o pretexto da misericórdia e da adaptação à ciência, existem forças que — tornando-a irreconhecível — querem reinventar a fé católica de acordo com as paixões do mundo.
Nesse contexto de ofensiva aberta para forçar a aceitação das uniões homossexuais, foi particularmente chocante ver que, sob o pretexto de obter indulgências jubilares, se ofereceu a grupos que professam abertamente tais erros uma ocasião de grande visibilidade. Permitiu-se que entrassem em procissão, portando uma cruz “arco-íris”, na Basílica de São Pedro. Mais grave ainda: esse verdadeiro desfile de “orgulho homossexual” foi precedido por audiência concedida ao Pe. James Martin, o qual, depois, atribuiu a Vossa Santidade palavras de encorajamento para seu ativismo em prol do movimento LGBT. Do mesmo modo, o bispo Francesco Savino declarou, no final de homilia na Igreja do Gesù, que Vossa Santidade lhe teria dito: “Vá celebrar o Jubileu organizado pela Tenda de Jonathan e outras organizações que cuidam de irmãos e irmãs [homossexuais].”[14]

Temos consciência de que alguns desses eventos chocantes (e outros que ainda estão na agenda) foram organizados pelos organismos da Santa Sé durante o pontificado anterior e que Vossa Santidade, talvez no desejo de garantir a unidade da Igreja, parece querer mudar a orientação da Cúria romana aos poucos. Porém, se é legítimo ceder em pontos secundários em prol da unidade, não parece legítimo fazê-lo quando isso implica em sacrificar a verdade: fazer a verdade é não apenas dizer o que é verdadeiro, mas também praticá-lo diante de muitas testemunhas, como ensina Santo Agostinho[15].
Uma grande esperança surgiu nos corações de milhões de católicos quando, no Jubileu das Famílias, Vossa Santidade citou a encíclica Humanae Vitae e asseverou que “o matrimônio não é um ideal, mas a regra do verdadeiro amor entre o homem e a mulher”[16]. Tal declaração ecoava o discurso ao corpo diplomático, em que reiterou que a família é “fundada na união estável entre o homem e a mulher”[17]. Mas essa esperança se converte em alarme diante do temor de que, como no pontificado anterior, as atitudes pastorais concretas continuem desmentindo na prática aquilo que se ensina na teoria.
Esse temor nos leva a renovar o pedido que já fizemos em 2015, na Filial Súplica ao Papa Francisco:
“Nesta situação, uma palavra esclarecedora de Vossa Santidade será a única via capaz de superar a crescente confusão entre os fiéis. Ela impediria a relativização do próprio ensinamento de Jesus Cristo e dissiparia as trevas que se projetam sobre o futuro dos nossos filhos, caso essa tocha deixe de lhes iluminar o caminho. Esta palavra, Santo Padre, nós Vo-la imploramos com o coração devotado por tudo o que sois e representais, certos de que ela não poderá jamais dissociar a prática pastoral do ensino legado por Jesus Cristo e por seus vigários, o que só aumentaria a confusão. Jesus nos ensinou com toda clareza, com efeito, a coerência que deve existir entre a verdade e a vida (cf. Jo 14, 6-7), assim como nos advertiu de que o único modo de não sucumbir é colocar em prática a sua doutrina (cf. Mt 7, 24-27).”[18]
Atrevemo-nos ainda a acrescentar respeitosamente dois pedidos concretos, que tornem patente o realinhamento da prática com o ensino tradicional da Igreja:
Imploramos que seja anulado o rescrito do Papa Francisco que conferiu valor de magistério à interpretação heterodoxa das ambiguidades da Amoris Laetitia, reiterando de modo claro que os divorciados recasados civilmente, vivendo more uxorio, não podem receber a absolvição sacramental nem, enquanto pecadores públicos, a Sagrada Comunhão.

Suplicamos que seja revogada a Declaração Fiducia supplicans e reafirmada a proibição de conceder qualquer tipo de bênção a pares homossexuais, conforme estabelecido no Responsum da Congregação para a Doutrina da Fé, de 22 de fevereiro de 2021, a propósito de um dubium sobre bênçãos a uniões de pessoas do mesmo sexo.
Pedindo a Vossa bênção apostólica, asseguramos nossas orações a Nossa Senhora do Bom Conselho e a Santo Agostinho, para que iluminem Vossa Santidade neste início delicado de pontificado, em que se vê involuntariamente confrontado com um legado de confusão e de divisão difícil de reparar.
15 de setembro de 2025
Festividade de Nossa Senhora das Dores

Instituto Plinio Corrêa de Oliveira (Brasil)
American Society for the Defense of Tradition, Family, and Property (USA)
Tradición y Acción por un Peru Mayor (Perú)
Asociación Civil Fátima la Gran Esperanza (Argentina)
Australian TFP Inc. (Australia)
Canadian Society for the Defence of Christian Civilization (Canada)
Fundación Roma (Chile)
Asociación Civitas Christiana (Colombia)
Deutsche Gesellschaft zum Schutz von Tradition, Familie und Privateigentum e.V. (Deutschland)
Sociedad Ecuatoriana Tradición y Acción Pro Cultura Occidental (Ecuador)
Tradición y Acción (España)
Société française pour la défense de la Tradition, Famille, Propriété – TFP (France)
Hrvatsko Ddruštvoza Zaštitu Tradicije, Obitelji i Privatnog Vlasništva (Hrvatska)
Irish Society for Christian Civilisation (Ireland)
Associazione Tradizione Famiglia Proprietà (Italia)
Ufficio Tradizione Famiglia Proprietà (Italia)
Stichting Civitas Christiana (Nederland)
Österreichische Gesellschaft zum Schutz von Tradition, Familie und Privateigentum – TFP (Österreich)
Sociedad Paraguaya de Defensa de la Tradición, Familia y Propriedad – TFP (Paraguay)
Philippine Crusade for the Defense of Christian Civilization (Philippines)
Fundacj a Instyt u t Edukacji Społecznej i Religijnej im. Ks. Piotra Skargi (Polska)
Instituto Santo Condestável (Portugal)
Nadacia Civitas Christiana (Slovensko)
Family Action South Africa NPC (South Africa)