Universalidade e atualidade da missão de Plinio Corrêa de Oliveira

Juan Miguel Montes

Correspondente de Catolicismo em Roma

Fonte: Revista Catolicismo, Nº 886, outubro/2024

O Brasil foi dotado pela Divina Providência de um território gigantesco e de uma riqueza incomensurável. Não estou dizendo isso por nacionalismo, pois sou chileno. Nos planos de Deus para este imenso País, sem dúvida havia também o desígnio de dotar o seu povo com dons morais e espirituais em harmonia com tamanha grandeza geofísica.

            É neste quadro providencial e gigantesco que se destaca a figura também gigantesca de Plinio Corrêa de Oliveira, que nasceu, floresceu, lutou, principalmente no seu Brasil, onde morreu há quase 30 anos. Porém, seu pensamento e sua obra já em vida não se limitaram apenas ao Brasil. São mais vastos que o Brasil e adquiriram relevância universal.

            Dr. Plinio desejava que sobre sua lápide no Cemitério da Consolação, em São Paulo, onde repousa, fosse escrito “Vir Catholicus” (Varão católico), pois para ele não havia maior honra do que ser filho da Igreja Católica. Mas, etimologicamente, catholicus significa também “universal”, o que torna muito maior o sentido desse desejo.

Na Itália, o pensamento de Plinio Corrêa de Oliveira

            Tentarei demonstrar esta afirmação com exemplos que me tocam de perto nas minhas atividades em Roma. Estou morando na Europa há quatro décadas. O Velho Mundo continua a ser o centro da vida cultural do planeta, e garanto que a figura de Plinio Corrêa de Oliveira se projeta no panorama cultural europeu com uma força crescente.

            Há pouco tempo, para nossa surpresa — dos discípulos de Dr. Plinio que vivemos na Itália —, tivemos conhecimento de um livro intitulado Il Pensiero Controrivoluzionario (O Pensamento Contra-revolucionário), escrito por um jovem estudioso, Diego Panetta, que dedica extensas e elogiosas páginas ao pensamento e à obra de Plinio Corrêa de Oliveira. Nem sabíamos da existência desse jovem estudioso. A esse livro vem-se somar a vasta bibliografia já existente na Itália de renomados intelectuais que têm comentado e divulgado a obra de Dr. Plinio.

            Para resumir, cito apenas alguns italianos: o Prof. Roberto de Mattei, que lhe dedicou duas biografias; Giovanni Cantoni e Massimo Introvigne, que também lhe dedicaram livros após sua morte em 1995. O famoso teólogo e intelectual Padre Gianni Baget Bozzo não hesitou em afirmar, num dos maiores jornais da Itália, que o que existe de escola católica contra-revolucionária se deve ao pensamento de Plinio Corrêa de Oliveira.

Alguns exemplos no campo eclesiástico

O célebre canonista, Pe. Anastasio Gutiérrez, por muitos anos decano da Faculdade de Direito Canônico da Pontifícia Universidade Lateranense de Roma, refere-se com estas palavras ao livro mais importante de Dr. Plinio: “Revolução e Contra-revolução é uma obra magistral cujos ensinamentos devem ser difundidos até penetrar na consciência de todos aqueles que se sentem verdadeiramente católicos […]. Sua análise do processo revolucionário é impressionante e reveladora […]. Ousaria dizer que é uma obra profética no melhor sentido. O seu conteúdo deveria ser ensinado nos centros superiores da Igreja”.

Por sua vez, o Cardeal Alfons Stickler, por muito tempo Reitor da Universidade Salesiana de Roma e mais tarde Prefeito da Biblioteca Vaticana, assim se refiriu ao eminente líder brasileiro: “Com a coerência de sua vida de autêntico católico, Plinio Corrêa de Oliveira oferece-nos a confirmação da fecundidade da Igreja […]. O serviço à Igreja exige não só retidão doutrinária, mas também espírito de sacrifício e penitência, proporcional à gravidade do momento. E Plinio Corrêa de Oliveira oferece-nos um exemplo claro disso com a sua vida e com a sua obra”.

            O Cardeal Arcebispo de Guayaquil [foto ao lado], Bernardino Echeverría, por ocasião da morte de Dr. Plinio, escreveu: “Plinio Corrêa de Oliveira dedicou todas as suas energias, durante sua longa e fecunda vida, à luta intrépida contra o processo de secularização revolucionária, no sentido de recristianizar a ordem temporal na perspectiva do Reino de Cristo, do Reino de Maria […]. Lembrando sua lúcida advertência e o autêntico cataclismo que abalou a Igreja, só podemos exclamar: Ah, se aquela voz tivesse sido ouvida!”.

Forte reação ao processo revolucionário

            Na sua época, no Brasil, no continente americano, no mundo inteiro e no seio da própria Igreja, a voz de Plinio Corrêa de Oliveira não foi suficientemente ouvida. Porém, com a ajuda da graça divina, isso tende a ser revertido. Pessoalmente acredito que essa influência está destinada a crescer e muito, por um motivo que tentarei explicar de imediato.

            Por quê? — Em sua obra capital, que é Revolução e Contra-Revolução, Dr. Plinio analisa a Revolução descristianizante como um processo. Se não tivesse havido um processo, uma caminhada de etapa em etapa, a Revolução não poderia ter-se imposto como se foi impondo ao longo dos séculos. Seu caráter processivo lhe serve para encobrir seus enganos. Sendo a Revolução uma obra do “pai da mentira” — como São João Evangelista chama a Satanás —, é só com o encobrimento de seus objetivos finais que ela avança e se consolida. E para isso é necessário um processo gradual.

            Sem um processo, teria sido impossível fazer uma opinião pública, grosso modo cristã, aceitar ideias como as que vemos hoje: aborto, eutanásia, LGBT etc. Em sua denúncia do processo revolucionário, Dr. Plinio demonstra aquele princípio de Santo Tomás que afirma que “o que é pequeno em seu início, é imenso em seu resultado”. Ou seja, é como um pequeno curso de água que nasce no alto da montanha e se torna imenso no momento em que atinge a planície e desagua no mar.

E aqui temos a primeira razão pela qual a obra de Dr. Plinio é hoje mais bem compreendida por um número crescente de fiéis católicos. À medida que o rio revolucionário se aproxima de sua foz, arrastando toda a lama que encontra em seu caminho, ele necessariamente se torna mais visível. Não é mais a torrente que se esconde entre as montanhas.

Assim podemos verificar que um número maior de pessoas está percebendo, nos acontecimentos desastrosos que nos rodeiam, a existência de uma rede mundial que os articula e promove; que se trata de uma força avassaladora como a do rio que chega à foz depois de ter eliminado todos os nossos princípios e valores. A ideia de uma enorme conspiração anticristã, contra a Igreja, contra a Cristandade, contra a família, contra a vida humana e contra a própria ordem natural das coisas, se configura nas mentes com maior clareza.

Estamos despertando para a realidade do fenômeno não só em suas ramificações atuais, mas também percebendo mais claramente que as águas turvas de hoje procedem das águas turvas de ontem, e que se traçarmos a corrente daquele poderoso rio, é possível reconstruir o processo até as suas origens há vários séculos.

Em suma, hoje o rio lamacento da Revolução anticristã mostra-se em toda a sua magnitude e hediondez, e não se esconde mais em meandros e esconderijos, tornando-se cada vez mais repelente aos olhos dos fiéis católicos e das pessoas que em geral respeitam a ordem natural das coisas. Desta forma, o quadro traçado pelo livro Revolução e Contra-Revolução, lançado em 1959, também se torna cada vez mais compreensível e atual.

Atualidade das teses de Revolução e Contra-Revolução

Revolução Protestante, Revolução Comunista e Revolução Francesa, três etapas de um processo que se desgasta em sua longa marcha em direção à sua meta: uma sociedade primitiva e tribalista.

            No entanto, nos anos em que Dr. Plinio viveu entre nós, o mundo ainda estava hipnotizado pelo otimismo. Os avanços na ciência, na tecnologia, na medicina etc. nos faziam pensar que a história caminhava para uma situação cada vez melhor, onde a pobreza, a doença e talvez um dia até a morte, seriam superadas. Em um tal contexto, não era fácil fazer ver à opinião pública otimista e despreocupada que o curso das águas turvas nascido no final da Idade Média nos teria arrastado para a imensa e pantanosa foz que hoje vemos em todo a sua feiura.

            Portanto, temos dois fatores convergentes. Por um lado, se a Revolução anticristã quiser alcançar a vitória definitiva sobre a Cristandade, não pode continuar a disfarçar seus objetivos mais radicais, tendo que arrancar necessariamente a sua máscara. Por outro lado, temos que o otimismo da opinião pública, baseado na ideologia de um progresso eterno e irreversível, tem diminuído muito à vista das catástrofes que em vários campos se acumulam sobre nossas cabeças, caso não haja uma radical correção de rota.

            Ambos os fatores do panorama atual — o inevitável autodesmascaramento da Revolução e a abertura gradual dos olhos de uma parte sã da opinião pública —evidenciam todo o acerto da obra Revolução e Contra-Revolução, colocando essa visão no centro da cena contemporânea.

            Podemos ter certeza de que assim como a iniquidade dos ataques revolucionários ainda vai se agravar, em sentido diametralmente oposto crescerá a compreensão da necessidade de uma ação contra-revolucionária na parte sã da opinião pública.

Denúncia proclamada no livro Em Defesa da Ação Católica

Plinio Corrêa de Oliveira nos anos 40

            Observemos como essa ampla visão de Plinio Corrêa de Oliveira foi ficando no centro da cena. Em 1943 — dezesseis anos antes de escrever Revolução e Contra-Revolução —, ele lançou o seu primeiro livro, Em Defesa da Ação Católica, e sua primeira grande campanha denunciando a penetração das ideias revolucionárias na Igreja. Anos mais tarde tal livro seria elogiado oficialmente pela Santa Sé, mas na época a denúncia custou muito ao autor, praticamente marginalizado de todo o seu apostolado nos ambientes católicos.

            Décadas depois, falando comigo sobre questões romanas, Dr. Plinio me fez ver como o que estava escrito no Em Defesa da Ação Católica — todo ele baseado em fatos e doutrinas dos neomodernistas — antecipava em pelo menos 20 anos aquela crise na Igreja que se manifestou muito mais claramente nos anos de 1960, durante e depois do Concílio Vaticano II.

            Mesmo eclesiásticos muito meritórios e leigos muito lúcidos só passaram a compreender a magnitude das tendências e ideias revolucionárias intereclesiais ao começarem a constatar, nos anos 60, os fatos clamorosos que levaram o Papa Paulo VI a falar em “autodemolição” da Igreja e da “fumaça de Satanás” que tinha penetrado no seu interior.

            Não se pode deixar de repetir com o cardeal Echeverría: “Ah, se aquela voz tivesse sido ouvida!” Além da ajuda da graça sobrenatural, como explicar o acerto das previsões de Plinio Corrêa de Oliveira? A razão é, basicamente, que ele fez do processo revolucionário o objeto de estudo e observação sistemáticos ao longo de sua vida. Percebeu muito cedo que esse processo de descristianização do mundo não poderia avançar se a Igreja continuasse a se opor e que, portanto, a única maneira de a Revolução ter sucesso era remover esse obstáculo.

            De que maneira? A Revolução havia constatado que era impossível destruir a Igreja através de inimigos externos. Era necessário infiltrá-la e desfigurá-la com um trabalho interno. Não só isso, a Revolução queria que o prestigio da própria Igreja fosse posto a seu serviço.

            Todos os elementos de crise que existem hoje na Igreja e que são objeto de tantos válidos estudos — crise da Fé, heterodoxia doutrinária, liturgia dessacralizada, pastoral mundana e socializante, entre outros — constituem desdobramentos do imenso quadro de penetração da Revolução na Igreja denunciado no livro Em Defesa da Ação Católica. 
            A partir de então, a história de Dr. Plinio é marcada por previsões que se confirmaram não só no que diz respeito à autodemolição da Igreja, mas também sobre a autodemolição da Cristandade ocidental, ambos fenômenos interativos. O conhecimento ante factum do curso do processo revolucionário não se deve a artes adivinhatórias ou a revelações místicas, mas àquela análise extremamente séria que o levou a conhecer todos os truques da Revolução rumo ao seu objetivo gnóstico.
A TFP realiza campanha no centro de São Paulo

Impedindo a vitória final do sistema comunista

Por falta de tempo e os limites desta matéria, seria impossível fazer uma lista do número de vezes em que Dr. Plinio antecipou as manobras revolucionárias. Limito-me a dar alguns exemplos.

Sobre o fato de ter criado no Brasil e na América Latina uma poderosa reação ao comunismo, cito uma conversa que tive com uma figura proeminente da Santa Sé, depois dos acontecimentos que levaram à queda do Muro de Berlim e à dissolução da União Soviética. Esta pessoa, que podemos classificar de progressista e adversária da entidade fundada por Plinio Corrêa de Oliveira no Brasil, a TFP (Tradição, Família e Propriedade), disse-me quase literalmente:

“A União Soviética tinha tudo nas mãos para vencer a guerra fria e estava a ponto de o conseguir. Se ela tivesse conquistado a América Latina naqueles anos, todo o equilíbrio geopolítico teria tombado a seu favor. Só que para conquistar a América Latina, o continente católico por excelência, o comunismo precisava conquistar o favor da Igreja. E foi neste contexto que surgiu a ação da TFP que impediu esta manobra.”

         Meu interlocutor estava certo. Isso pode ser comprovado. Em 1984, a Santa Sé condenou a “Teologia da Libertação”, corrente que favorecia a manobra de infiltração comunista na Igreja. Certamente foi uma intervenção muito meritória. No entanto, deve-se notar que em 1968 — ou seja, 16 anos antes da condenação da Santa Sé, quando o nome “Teologia da Libertação” nem sequer existia —, Dr. Plinio já havia feito uma campanha que coletou dois milhões de assinaturas contra a infiltração comunista na Igreja para entregar ao Papa Paulo VI.

            E nesses 16 anos — que foram de eco contínuo de fidelidade ao brado lançado em 1943 com o livro Em Defesa da Ação Católica — são incontáveis as atividades editoriais e campanhas de rua empreendidas pela TFP para afastar esse perigo, todas elas dirigidas diretamente por Plinio Corrêa de Oliveira.

            Menciono aqui apenas a Declaração de Resistência à política vaticana de distensão com os regimes comunistas, em abril de 1974. No caso específico do Brasil, as várias ações de denúncia das comunidades eclesiais de base, braços operativos da “Teologia da Libertação” e do PT, que tantos desastres trouxeram ao Brasil após o falecimento de Plinio Corrêa de Oliveira, em outubro de 1995.

Santidade pessoal, pensador, fundador e líder de movimentos

Mais uma vez, convém lembrar o que disse o Cardeal Echeverría: “Ah, se aquela voz tivesse sido ouvida!”

Neste ponto, faço uma pergunta e uma constatação. Quanto o movimento conservador que hoje floresce no Brasil deve à ação de Dr. Plinio? À medida que ele vai ficando mais distante no tempo, sua ‘presença’ nos acontecimentos, muitas vezes de modo implícito, vai incrementando a resistência da opinião pública à Revolução.

Prof. Ettore Gotti Tedeschi, afirma peremptoriamente: “Um encontro com o Prof. Plinio muda a vida de uma pessoa.”

O fenômeno não se limita ao Brasil. É mundial. Muitos são aqueles que, nos quatro cantos do planeta, percebem hoje a importância de Plinio Corrêa de Oliveira, como por exemplo o ex-presidente do Banco Vaticano (IOR), Prof. Ettore Gotti Tedeschi [foto], que afirma peremptoriamente: “Um encontro com o Prof. Plinio muda a vida de uma pessoa.” Ou então o testemunho do Prof. Massimo de Leonardis, ex- decano de Ciencias Políticas na Universidade Católica de Milão, quando afirmou recentemente de modo também categórico: Plinio Corrêa de Oliveira é uma figura excepcional do catolicismo dos nossos tempos. Foi um pensador da grande cultura teológica, foi um líder político, foi professor universitário, publicitário e escritor. É difícil, especialmente neste século, encontrar dons eminentes de santidade pessoal, de pensador, de fundador e de líder de movimentos cívicos, unidos na mesma pessoa .”

Esses são alguns depoimentos de amigos de Plinio Corrêa de Oliveira, mas sua atualidade é também confirmada por parte daqueles que, do lado oposto, ao atacar a sua obra, por vezes com raiva, reconhecem todo o seu valor.

Manifestação pela legalização da maconha e do aborto, na Avenida Paulista (São Paulo).

Denúncia do nascimento de uma Quarta Revolução

            Dr. Plinio viveu a parte mais importante de sua luta enfrentando aquela etapa da Revolução que é o comunismo, mas sabia que o objetivo final da Revolução ia muito além do superestado soviético, e que, em última instância, pretendia desmantelar todo e qualquer vestígio de civilização, estabelecendo um estado de coisas ainda mais radical que o comunismo soviético.

            A queda do Muro de Berlim ocorreu em 1989, e o fim da União Soviética dois anos depois, em 1991, mas o advento dessa nova etapa pós-soviética, chamada pelo Dr. Plinio de Quarta Revolução, ele a denunciou de modo explícito em um complemento escrito em 1977, para sua obra Revolução e Contra-Revolução. Ou seja, muito antes de esses eventos acontecerem.

            Em que consiste a 4ª Revolução, segundo o autor? As grandes revoluções anteriores (a Protestante, a Francesa e a Comunista) haviam efetuado mudanças imensas nas estruturas religiosas e sociopolíticas. Desta vez deveria haver uma revolução “in interiore homine”: uma mudança radical na mentalidade de todos e cada um dos homens, preparando o caminho para o que alguns sociólogos e filósofos chamam de pós-humanidade.

            A partir do movimento hippie e anarquista que se concretizou nos anos 60, Dr. Plinio concluiu que estávamos nos defrontando com a eclosão desta nova etapa pós-humana, que hoje vemos triunfante no libertarianismo e no relativismo moral completos, na expansão do amor livre, das drogas, do aborto e, em um número crescente de nações, mesmo da eutanásia; sem sequer poupar a inocência das crianças com a imposição no ensino da ideologia LGBT.

Tribalismo Indígena apresentado como modelo de vida

Dada a crescente infiltração revolucionária nos meios católicos desde a década de 1960, para Dr. Plinio a imensa transformação sociocultural provocada pela Quarta Revolução não poderia deixar de ter também profunda ressonância dentro da Igreja. No mesmo ano em que escreveu sobre a nascente Quarta Revolução na sociedade (1977), denunciou como essa Revolução estava penetrando na Igreja em um dos livros mais proféticos e certeiros de sua vida: Tribalismo Indígena – Ideal Comuno-Missionário para o Brasil no século XXI.

Nessa obra, Dr. Plinio mostrou como proeminentes bispos e teólogos apresentavam os índios da selva e seu estado primitivo como modelo de vida, considerando-os os autênticos “evangelizadores do mundo”. A suposta simplicidade e ingenuidade de suas vidas era apresentada por esses homens da Igreja como exemplo para as sociedades civilizadas…

Era realmente difícil para o homem comum de então aceitar que a sociedade dos avanços tecnológicos pudesse seguir esses modelos. Porém, anos depois, com a gigantesca pressão sobre a opinião pública no sentido de que o homem civilizado, especialmente o homem ocidental, está supostamente destruindo os recursos do planeta, vemos que esse modelo primitivo e tribalista vem sendo proposto com ênfase cada vez maior, especialmente pelos membros progressistas da Igreja Católica.

Sínodo da Amazônia, “Mãe Terra” e Pachamama

Chegada do navio “Gaia” na Praia do Flamengo, no Rio de Janeiro, por ocasião da abertura da Eco-92.

Foi assim que chegamos ao ano 2019, em que o Papa Francisco, no contexto de um solene sínodo no Vaticano, propõe as tribos amazônicas como exemplos de “bom viver”, sobretudo em consideração do fato de que esse “bom viver” consiste em não ferir a “Mãe Terra”, um objetivo ambientalista cada vez mais central.

Aliás, esta previsão profética de Dr. Plinio serviu de ponto de orientação para a denúncia do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira e de outros discípulos do eminente líder católico sobre a importância do Sínodo da Amazônia, especialmente pelo caráter que adquiriu de culto pagão à Mãe Terra. A denominada “Mãe Terra”, na forma de um ídolo chamado Pachamama, foi cultuada na própria Basílica de São Pedro durante aquele Sínodo realizado em Roma.

A Pachamama sendo “cultuada” nos jardins do Vaticano, com a presença do Papa Francisco

O Sínodo da Amazônia veio confirmar a visão de águia de Dr. Plinio a respeito do curso que os acontecimentos tomariam. Em 1977, a exaltação do ideal tribalista indigenista parecia uma extravagância ideológica. Entretanto, quando o ambientalismo verde sugere hoje, em toda parte, um plano global tendente a um declínio drástico da produção de riqueza, vemos configurar-se como um imenso fantasma no horizonte o que na época não parecia plausível.

O documento do Sínodo da Amazônia pede abertamente o desmantelamento do modelo econômico do Ocidente, apostrofado como modelo “ecocida” e “extrativista”, e, entre outras coisas, propõe o relançamento das Comunidades Eclesiais de Base, berço de boa parte daquele PT que, cada vez mais impopular, busca atualmente renovar-se a partir dos púlpitos.

            Sobre o tema ambientalismo ideológico, Dr. Plinio percebeu imediatamente a importância do assunto, no sentido de se criar uma nova mentalidade para conduzir a civilização no caminho de sua desconstrução, segundo a expressão cunhada pelos filósofos mais revolucionários.

            Por ocasião da famosa conferência internacional patrocinada pela ONU no Rio de Janeiro, denominada ECO-92, Dr. Plinio dedicou-se à sua análise. Enviou uma qualificada delegação à capital fluminense para acompanhar passo-a-passo os eventos. As revistas das TFPs publicaram diversos artigos sobre os acordos alcançados naquela ocasião, mostrando à opinião pública que nos encontrávamosperante uma passagem fundamental na história da Revolução, a passagem do “vermelho” (comunista) ao “verde” (ecologista).

            Trinta anos depois, fala-se em todos os fóruns internacionais mais importantes de uma reorganização do mundo (um “great reset”) a ser realizado em seguida à pandemia do coronavirus e da precária situação econômica que se tem gerado. Esse “great reset” inspira-se largamente no que se estabeleceu no Rio de Janeiro na ECO 92. Talvez a maior novidade em relação àquela época seja a de que, com a encíclica Laudato Si, a agenda ambiental se tornou uma prioridade também da Igreja.

            Como continuação do inputdado ao assunto ecologista pelo Dr. Plinio há 30 anos, eu não poderia deixar de mencionar a divulgação mais recente do livro Psicose Ambientalista, de autoria do Príncipe Dom Bertrand de Orleans e Bragança.

            Omito aqui tratar das inúmeras campanhas, publicações, conferências contra o avanço da esquerda no Brasil e na América Latina, pois seus temas já são conhecidos dos leitores da revista Catolicismo.

            Também não me detenho na forma como os membros da TFP brasileira mantiveram acesa a chama de fé e esperança nas ruas e praças desse imenso país numa época em que o comunismo espreitava perigosamente. Nem tampouco na epopeia das caravanas de jovens da TFP que percorreram toda a extensão do território nacional, por anos a fio, sem retornar às suas cidades de origem.

            As brilhantes campanhas da TFP, com suas capas e estandartes vermelhos com heráldico leão dourado, marcaram o panorama de grandes e pequenos centros do Brasil e foram imitadas pelos discípulos de Dr. Plinio espalhados pelos cinco continentes, criando um fenômeno de marketingde ideias que nem o Brasil, nem as Américas, nem a Europa conheciam até então.

Até adversários confirmam a eficácia da ação da TFP

            Estarei exagerando nas afirmações acima?

         Cito apenas dois adversários da TFP, portanto insuspeitos, que confirmam o que acima mencionei. Em 1969, Oliveira Bastos, jornalista de esquerda, escreveu no jornal Tribuna da Imprensa:

            “A TFP estava em uma sessão de gala. Confesso que, de longe, fiquei agradavelmente impressionado. Sem dúvida, há bom gosto na escolha das cores exibidas, tanto nos uniformes quanto nos estandartes. Há uma sensação de teatro total em suas evoluções. Enquanto um rapaz brada slogans com um megafone, outro, de forma perfeitamente heráldica, vira levemente a bandeira. Outros correm, em perfeita harmonia coreográfica, para abordar os pedestres oferecendo-lhes um jornal.

“À distância, a TFP impressiona pela sua dimensão estética, pelo jogo de cores, pela presença invisível de um ‘metteur-en-scène’. Se toda tradição, toda família e toda propriedade tivessem um terço da apresentação harmoniosa desse grupo, até eu, homem de esquerda, ficaria tentado a pegar um estandarte e sair pelas ruas da cidade em defesa dessas instituições […]. Todo mundo quer saber o nome do ‘regista’ do grupo, assim como do estilista que criou esses uniformes”.

            E a artista comunista Judith Malina, diretora do Living Theatre, analisa, num artigo publicado em O Estado de São Paulo (12-7-2018), o impacto estético das campanhas idealizadas pelo gênio de Plinio Corrêa de Oliveira:

            “Uma manhã, bem cedo, soam gritos no lado de fora da casa; um grito de militância nos acorda e olhamos pela janela. ‘Tradição! Família! Propriedade!’ gritam dez jovens […] com una estola de cetim vermelho pendurada nos ombros. Eles fazem teatro de rua. Carregam um estandarte vermelho bem grande […] com a dignidade dos estandartes que a Igreja carrega nas procissões. O inventor dessas peças tem ótimo senso de teatro de rua. Dentro da forma rígida, ele explora as possibilidades plenamente: som e cor e roupas; contato, coro e bandeiras”.

            Essas técnicas de marketingde ideias contra-revolucionárias serão imitadas na Europa e nas três Américas, levando a tremular o rubro estandarte da TFP até mesmo na Praça Vermelha de Moscou [foto ao lado], quando ainda a bandeira da União Soviética estava colocada no palácio do Kremlin, junto à dita Praça. Foi uma guerra de símbolos, vencida pela chama da fé e de coragem que Dr. Plinio tinha acendido no Brasil.

Após o falecimento do Prof. Plinio, sua luta continua

            Plinio Corrêa de Oliveira não está mais entre nós desde o dia 3 de outubro de 1995. Mas, perguntamos, poderiam seus discípulos abandonar a escola de militância contra-revolucionária por ele criada e por ele elevada a uma indiscutível repercussão mundial? Poderiam seus discípulos apagar aquela chama de fé e coragem que desde o território brasileiro iluminou o planeta?

            Certamente não! Principalmente se considerarmos que, desde o seu falecimento, a Revolução intensificou muito a sua ofensiva para demolir a Igreja e a civilização por Ela inspirada. Pensemos apenas no que se faz contra a família natural — essa família que Engels, co-fundador com Marx do comunismo, afirmava ser o maior obstáculo para impor a nova sociedade comunista. Hoje a defesa da família é o campo de batalha mais acirrado da luta entre a Revolução e a Contra-Revolução.

            Após a ausência do Dr. Plinio, a família natural tem sido equiparada a todos os tipos de uniões, homossexuais e transgênero: partidos de esquerda têm propagandeado abertamente o amor livre, às vezes até a favor da pedofilia. A dissolução de casamentos foi facilitada por todos os meios com divórcios cada vez mais fáceis de obter. A prática do controle da natalidade por meios moralmente ilícitos se difundiu amplamente; o aborto tem sido legalizado em muitas partes, podendo em alguns países ser executado até no nono mês. Acima, já mencionei a corrupção de menores com o ensino da ideologia LGBT.

            Tudo isso merece ou não os pronunciamentos e denúncias dos discípulos de Plinio Corrêa de Oliveira? Ou, para não perturbar as forças da Revolução, seria melhor recolher os estandartes que foram galhardamente levantados ao longo das décadas?

            Não poderei entrar aqui em detalhes sobre as ações realizadas segundo o modelo estabelecido por Dr. Plínio. Seriam muitos: no Brasil, nos Estados Unidos, nas demais nações da América Latina, na Europa.

            Por exemplo, a epopeia cotidiana do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira, realizada com ousadia e coragem nas ruas, na web, em congressos, com caravanas que percorrem o território nacional para fortalecer aquele movimento conservador de opinião pública brasileira que nos últimos tempos tem dado um bom exemplo ao mundo inteiro.

O que dizer da corajosa TFP norte-americana, que faz desfilar seus estandartes em cidades e universidades daquele país tãodecisivo para o resto do mundo, dando alento ao movimento conservador?

Necessidade de se continuar em “estado de Resistência”

            Em conclusão, uma palavra sobre a ação dos discípulos do fundador da TFP brasileira no mais decisivo dos cenários, o da Igreja Católica.

            Já mencionei anteriormente, com um comentário de um alto representante do Vaticano, o papel decisivo que a TFP teve nos estágios finais da Guerra Fria para evitar que o continente latino-americano caísse no comunismo, assim como a importância do livro Em Defesa da Ação Católica e as reiteradas denúncias ás propostas da esquerda católica nos anos 60 e 70: “Teologia da Libertação”, Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), o tribalismo indigena apresentado como modelo para a sociedade etc.

            Muitas dessas ideias revolucionárias estão sendo pregadas ainda hoje, e é doloroso, mas necessário reconhecê-lo, pela cátedra mais alta da Igreja. Dr. Plinio e as TFPs já haviam expressadode maneira filial ao Papa Paulo VI toda a sua perplexidade sobre a política de distensão da Santa Sé com os regimes comunistas — política que objetivamente reforçava o comunismo internacional. Dr. Plinio e as TFPs se declararam naquela época em estado de resistência, segundo o modelo ensinado por São Paulo na carta aos Gálatas e comentado por santos e teólogos como o exemplo a ser seguido no caso histórico da filial advertência a Pedro.

            Os acontecimentos que levaram Dr. Plinio e seus discípulos a dar esse delicado passo em 1974 mostraram a licitude da resistência além do que foi ensinado pelo Apóstolo São Paulo?

            Se visse hoje a introdução do que conhecidos teólogos e canonistas chamam de “divórcio católico”, Dr. Plinio, que lutou denodadamente contra o divórcio civil, não combateria também aquilo que desde o inicio do atual Pontificado vem sendo feito para facilitar a sagrada comunhão aos divorciados que voltaram a se casar? Isso não é um incremento ao processo de relativização da indissolubilidade do vínculo matrimonial? Sem dúvida, faz parte daquele processo de relativização moral que tem ocasionado os tão evidentes danos mencionados acima.

            Por isso, os discípulos de Dr. Plínio, num esforço de coordenação de numerosas entidades afins pelo mundo, tiveram a iniciativa de lançar uma Filial Súplica ao Papa Francisco para interromper esse processo já em curso e reiterar com firmeza a doutrina da indissolubilidade conjugal, bem como a disciplina que proíbe receber a Eucaristia levando uma vida extraconjugal.

            Foram coletadas um milhão de assinaturas, entre elas mais de 200 bispos, numerosos cardeais, teólogos, canonistas, professores de faculdades etc. Embora esse pedido não tenha sido atendido, ele criou um estado saudável de alerta na opinião pública católica. Inúmeras iniciativas, especialmente depois dos dois Sínodos sobre a Família e da Exortação Amoris Laetitia, foram postas em marcha. Para citar apenas a mais importantedelas, as “dubbia” (as dúvidas), apresentadas ao Papa por quatro ilustres cardeais.

            Não são apenas as novidades teológicas que vêm suscitando reações em todo o mundo. É também a clara índole político-social de um pontificado que em nome de uma espécie de novo credo ecologista leva inúmeros pastores a condenar o modelo socioeconômico do Ocidente e a promover variantes ambientalistas da “Teologia da Libertação”. Basta dizer que um dos assistentes para a elaboração da encíclica Laudato Si foi o ex-sacerdote Leonardo Boff.

            A recente encíclica Fratelli Tutti tem relativizado a importância da propriedade privada em favor de fórmulas socializantes de propriedade, apesar do fracasso retumbante dos países que aplicaram a receita socialista. Líderes dos chamados “movimentos sociais”, como o MST, têm sido prestigiados em vistosas reuniões vaticanas. A Santa Sé tem assinado com eles declarações oficiais em que se promovem “formas comunitárias de organização do trabalho, da terra e da moradia”. Foram também convidados a várias reuniões no Vaticano notórios abortistas ou ativistas da contracepção artificial.

            Diversamente dos princípios morais não negociáveis — que o Papa Bento XVI promoveu prioritariamente —, o atual pontificado coloca como prioridades a preservação do meio ambiente e o direito à imigração de países mais pobres para países mais ricos, bem como uma redistribuição geral da riqueza.

            Toda esta realidade foi descrita no livro A Mudança de Paradigma do Papa Francisco, escrito pelo estudioso José Antonio Ureta, membro do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira e colaborador da revista Catolicismo.

Diante da imensa “mudança de paradigma”, os discípulos do Prof. Plinio não poderiam se calar. Mas, como falar? Só poderia ser com o espírito e a linguagem do Mestre, que com imensa lealdade se dirigiu nos seguintes termos ao Papa Paulo VI em 1974, por ocasião de sua Declaração de Resistência diante da política de distensão do Vaticano com os regimes comunistas:

“O vínculo da obediência ao Sucessor de Pedro, que jamais romperemos, que amamos com o mais profundo de nossa alma, ao qual tributamos o melhor de nosso amor, esse vínculo nós o osculamos no momento mesmo em que, triturados pela dor, afirmamos a nossa posição. E de joelhos, fitando com veneração a figura de S.S. o Papa Paulo VI, nós lhe manifestamos toda a nossa fidelidade. Neste ato filial, dizemos ao Pastor dos Pastores: Nossa alma é Vossa, nossa vida é Vossa. Mandai-nos o que quiserdes. Só não nos mandeis que cruzemos os braços diante do lobo vermelho que investe. A isto nossa consciência se opõe.”

“Os homens combatem, e Deus dá a vitória!”

         Temos atualmente outro Papa na cátedra de São Pedro. Embora o lobo que avança neste momento seja mais “verde” do que “vermelho”, nossa resistência não pode ser senão a mesma expressa no histórico manifesto de Resistência redigido por Plinio Corrêa de Oliveira.

Este modelo de resistência é o farol que orienta uma posição justa e razoável para muitos dos que assistem perplexos à “mudança de paradigma” na Igreja, e às tentativas de uma nova ordem (ou desordem) mundial na sociedade temporal.

Ser fiel à escola de pensamento de Plinio Corrêa de Oliveira significa continuar a sua luta, com a esperança arraigada na convicção da intervenção de Deus. A posição do fundador da TFP brasileira se resume na sublime frase de Santa Joana d’Arc: “Os homens combatem, e Deus dá a vitória!”

            A Revolução não poderá ser derrotada apenas pela ação humana, sem a intervenção de Deus, sem a intercessão de Maria Santíssima. Mas é precisamente a fidelidade à qual todos somos convidados; ela, por assim dizer, força Deus a intervir nos acontecimentos. Uma fidelidade que naturalmente, como Dr. Plinio no-la ensinou com o seu exemplo, não se sustenta sem o primado da oração, da vida sacramental e espiritual, mas que não se omite na hora da batalha.
            Acreditamos que, do Céu, Dr. Plinio abençoa a ação contra-revolucionária que se realiza nas difíceis circunstâncias dos nossos dias, até que os tempos da Revolução sejam definitivamente substituídos pela vitória final do Imaculado Coração de Maria prometida em Fátima.