de Jacinto Flecha
A semelhança dos três era tanta, que o nome da barbearia não causava estranheza. Mas eu sempre encontrava ali os mesmos três, e resolvi perguntar pelos cinco que completariam o grupo.
— Os outros não são barbeiros. Uma irmã é a manicure que trabalha aqui, mas os demais nem vieram para a capital. Continuam no interior, com outras profissões.
— Então o nome da barbearia é uma homenagem à família?
— Homenagem e também gratidão. Porque eles nos ajudaram a comprar tudo aqui, inclusive o imóvel, que é propriedade nossa. Já conseguimos devolver a eles todo o empréstimo, e brevemente vamos abrir outra loja, que terá o mesmo nome.
— Meus parabéns! Vejo que vocês são empreendedores. Já admirava sua família por ser grande, e agora passo a admirá-la também por ser muito unida.
— Graças a Deus, Doutor! Isso nós aprendemos do nosso pai, que ainda é vivo.
— Aposentado, certamente.
— Não exatamente, Doutor. Ele prefere continuar trabalhando, porque não gosta da ociosidade. De fato ele não precisaria trabalhar, pois tem o necessário para se manter. Além disso, cada um dos filhos está sempre procurando um meio de retribuir tudo o que ele fez por nós.
— Isso é muito bonito. Mas vocês não acham que seria melhor ele receber uma aposentadoria? É o que todo mundo faz: enquanto pode trabalhar, vai fazendo um pecúlio, e depois descansa.
— À custa de outros que nem o conhecem, não é?
A resposta me desconcertou. De tal modo está arraigada a mentalidade previdenciária moderna, que eu não imaginava existir atualmente quem procedesse à moda antiga, quando a previdência era feita pelas famílias, era um assunto interno das famílias. A atual previdência imposta ao País — também ao mundo inteiro, e gerando situações insolúveis — supõe que o trabalhador pague para outro usufruir, na esperança de que num futuro remoto haja dinheiro para ele usufruir o que outros paguem.
E o barbeiro prosseguiu, com segurança:
— Veja, Doutor, cada um de nós ajudaria nosso pai com todo o carinho e interesse, caso ele viesse a precisar. E ajudaríamos também algum irmão que estivesse em dificuldade. Não é só a gratidão por eles nos terem ajudado quando precisamos, mas porque é a nossa família. Isso é muito diferente de ser o segurado número quinze milhões e tanto, um anônimo recebendo o dinheiro de outros anônimos.
— É isso mesmo! O segurado da Previdência recolhe a contribuição porque é obrigado. Não sabe para onde vai o dinheiro, não conhece quem administra nem quem receberá o dinheiro dele. Tudo impessoal, ninguém é dono. Já o que é de vocês fica em casa, entre gente que se conhece e se estima.
— Nós não temos nenhuma contribuição obrigatória nem um caixa comum. Cada um faz um pé-de-meia como pode, para as incertezas do futuro. Nosso pai nos ensinou a agir assim. Nunca a nossa previdência vai quebrar, pois cada um só gasta ou guarda o que tem. E ainda pode recorrer aos outros quando precisar, com uma flexibilidade e presteza que nenhuma instituição oficial pode ter.
— Está todo mundo preocupado com a quebradeira da Previdência, e eu concordo que a situação de vocês, que estão fora dela, é muito tranquila e melhor. Os políticos vão implantar uma reforma que talvez não seja honesta, não resolve nada e vai prejudicar muita gente. A Previdência voltará a estourar dentro de alguns anos, porque o número de contribuintes vai caindo, e o de beneficiários aumentando.
— O mais provável é que estoure mesmo. Se não houvesse roubalheira, fraudes, desvios de verba e medidas eleitoreiras, o problema ia diminuir, mas não ia acabar nunca. A máquina administrativa é pesada e cara, de modo que as contribuições arrecadadas vão ficando pelo caminho, só chega aos aposentados uma parte. No sistema nosso, fica tudo na família. Uns vão progredir mais do que os outros, é claro, pois neste mundo não há duas pessoas iguais. Cada um vai viver com o que tem, poupar uma parte para as dificuldades futuras, e sempre com a certeza de poder contar com os outros, se precisar.
Saí da barbearia mais leve, não só pela redução da massa capilar. Os barbeiros têm fama de conhecer a solução para todos os problemas. Aqueles irmãos solucionaram de fato o problema da Previdência, pelo menos no que se refere à própria família. Solução real, boa, simples. E honesta.
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(*) Jacinto Flecha é colaborador da Agência Boa Imprensa (ABIM)
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Esta coluna semanal pode ser reproduzida e divulgada livremente
Há tempos, vendo que aumentam os divórcios e cresce a longevidade, imaginei que teríamos no futuro muitos velhos solitários. Propus aos familiares fundarmos um asilo para nossa gente, onde pudéssemos envelhecer no meio de tios e primos. A ideia, por enquanto, não vingou.
Gostei deste comentario de Jacinto Flexa. Afinal de contas essa conclusão de que nós pagamos pela nossa futura aposentadoria e com esse dinheiro o governo aposenta outros… francamente está bem pensado. A conclusão que eu tiro é que o mundo está cada vez sendo escravisado e nós no Brasil escravos desse PT que a toda hora cria novos impostos. Parabéns.